ZÉ DO POVO…

                Na famosa cidade onde os eleitores esperavam quatro
anos para trocarem votos por cestas básicas, dentaduras, camas, botijão de gás,
espetinho de gato, cerveja e cachaça, Zé do Povo, o famoso vereador, estava
disputando seu quarto mandato. A concorrência era intensa, Zé do Povo confiava
em sua gente. Eram pessoas que acreditavam em promessas nunca cumpridas e era
tão fácil enganar aos mais humildes.
         No
decorrer de doze anos, em seus três mandatos, jurara construir um teleférico,
um campo de futebol, duas creches, uma maternidade, trazer indústrias para o
município, incentivar o turismo e dar maior atenção às estradas rurais. Seus
atuais concorrentes trilhavam o mesmo caminho, cada qual prometia mundos e
fundos. Zé do Povo não podia perder o cargo, sua única fonte de renda, seu
emprego tinha de ser vitalício.
         Durante
seus três mandatos recebeu da municipalidade, só em salários (R$4.000,00
mensais), o montante bruto de R$624.000,00… Contando com as verbas
representativas, mais uns R$187.000,00… As viagens, os restaurantes, os
hotéis… No total em três mandatos seus ganhos chegaram a R$980.000,00. Nada
mau para quem nunca teve profissão definida, concluiu a duras penas o ensino
fundamental e vivia de espertezas. Possuía uma bela casa, um bom carro e nada
mais… Dinheiro fácil vai fácil.
         Adormeceu
com a consciência tranquila, era o dia da eleição, votara pela manhã e queria
descansar um pouco… Até o momento comprara o voto de mil e quinhentos
eleitores, com certeza obteria uns oitocentos votos e podia se considerar um
vencedor… Colocou o relógio para despertar às seis horas da manhã seguinte…
Relaxou.
         Olhou
do terraço de sua mansão e não encontrou as faixas tão esperadas que saudassem
sua permanência no Olimpo. Saiu para a rua ao encontro do seu povo. O que
aconteceu? Os transeuntes nem sequer tentavam beijar a sua mão… Meu Bonje!
Será que perdi a eleição? Avistou o senhor Dito Bagunça e perguntou aflito
sobre o resultado do pleito. “Seu nome não consta na lista dos eleitos. Acho
que o senhor teve uns setenta votos se não me engano!”
        
“Seu Dito! O senhor não está enganado?” Indagou Zé do Povo.
        
“Não seu Zé! Agora dá licença que vou procurar meu candidato para comemorar a
vitória.” Safou-se Dito Bagunça.
        
“Sem vergonha, salafrário, cafajeste!” pensou Zé do Povo, “ontem mesmo paguei
umas pingas para o infeliz que jurou lealdade eterna… Minha Excelência está
profundamente magoada… Adeus viagens, adeus notas fiscais alteradas, adeus
salamaleques e aplausos… Que farei de Minha Excelência? Sem estudo, sem
profissão, sem um cargo público bem remunerado terei que prestar concurso e
ganhar salário mínimo? Que povo ingrato! Dei os melhores anos de minha vida em
beneficio da coletividade e agora recebo um pontapé… Tomara que meu candidato
a prefeito tenha vencido, assim descolo um cargo de assessor e talvez ganhe
mais que um vereador.”
         Um
tanto ressabiado, Zé do Povo, se dirigiu a Praça da Matriz prestando atenção
nos comentários do povo. ”Finalmente nossos eleitores acordaram! Chega de
promessas, queremos realizações… Toda a Câmara Municipal foi renovada,
ninguém foi reeleito… Ideias novas, gente nova, novas possibilidades.” “A
cidade merece respeito, conseguimos nosso intento, tiramos o que pudemos dos
candidatos sacanas e votamos em pessoas dignas de nos representarem!” “Chega de
politicagem, a cidade necessita crescer!” “Novos tempos, novos rumos!”
        
do Povo estava arrasado… Nunca fora realmente estimado… Seu dinheiro que
comprava eleitores também comprava o atraso… Notou as ruas esburacadas, o
lixo não recolhido, os pedintes assediando os poucos turistas… Uma cidade com
tudo para dar certo… Uma natureza deslumbrante, água abundante… Um povo
festeiro e receptivo… Que potencial desperdiçado! Como gostaria de ter uma
nova chance, fazer o certo… Pensar no bem estar do povo, arrumar melhor a
cidade… Eu vou mudar… Eu vou mudar… Eu vou mudar…
         Trim…
Trim… Trim… Trim… Zé do Povo acordou, eram seis horas da manhã. Tivera um
pesadelo? Um aviso? Uma visão do futuro? Meu Bonje! Eu prometo que se sair
vencedor mudarei minha conduta… A cidade merece respeito! Não posso continuar
matando o sonho das pessoas… Ajude-me!
Gastão Ferreira/2012
            

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