A MUSA…

         Nunca
se sentira tão alegre, disputada por todos os homens, seus olhares ardentes a
desejavam. Pelo salão do barzinho a bebida corria farta e os petiscos, coisas
raras, eram devorados mal apareciam. Sua Pomba-gira Maria Navalha estava semi-incorporada
e quando Maria Navalha grudava nenhum homem desgrudava. Vovó Nachel fora
cuidadosa ao prescrever o banho de axé; – “Não esqueça as sete rosas vermelhas
nem a garrafa de pinga!”, avisara com antecedência.
         Calça
colante, sapato plataforma, lábios de carmim, fio dental para enlouquecer a
rapaziada e estava pronta para mais uma noite de caçada ao grande amor
prometido e jamais encontrado.
         Três
filhos, um de cada pai. Cada criança um engano, parte da eterna procura pelo
homem que a transformaria em rainha do lar. Quase meio século de vida, gorda,
alguns dentes perdidos, varizes fazendo questão de dar um alô, barriga de
tanquinho de guerra… Sem pensão alimentícia, dava um duro danado para manter,
alimentar e vestir as crias.
         Vovó
Nachel poucas vezes se enganara e se as cartas disseram que hoje seria o grande
dia, com certeza algo de muito bom mudaria sua vida para sempre. Aceitou mais
um copo de cerveja… A noite era apenas uma criança e neste momento, ela
Vanilda, também se sentia uma menininha carente querendo mimo, querendo colo…
Dançava e recordava.
         Encontrou
o primeiro companheiro aos dezessete anos. Homem bom o Ramiro! Pescador, pobre,
sonhador… Com ele teve Dudu, seu filho mais velho, que está na prisão. Nada
de grave! Porte ilegal de arma e tráfico de drogas… Ramiro morreu afogado, a
casa era alugada, não deixou nada, a loja levou a tevê e a geladeira não
pagas… O casamento durou dez anos que passaram rápidos demais.
         Lavou
roupa para terceiros, fez “geladinhos” para Dudu vender, ficou anos sem por a
cara para fora da casa, por pouco não virou crente. Sentia-se sozinha, começou
a beber, tomou gosto… Numa noite, sem avisar, Maria Navalha sua Pomba-gira
chegou para ficar… Vanilda tomou coragem e pediu o que mais queria; – Um homem
para chamar de seu! Encheu a cara, vestiu a roupa mais espalhafatosa, muito
batom vermelho, frente ao espelho treinou caras e bocas… Estava vestida para
conquistar corações, era uma pistoleira solitária… Gargalhou!
         Quando
engravidou de Manuela, Sérgio escafedeu-se, fugiu para Curitiba e seu nome,
descobriu depois, não era Sérgio era Otávio e não foi para o Paraná, foi morar
no Chile para não pagar pensão.
         Perto
dos quarenta e cinco anos apaixonou-se de verdade. Valdo era tudo o que queria.
Um gato no cio, vinte anos de idade com experiência de um cachorro tarado de
quarenta. Por ele quase se prostituiu… Sustentou o malandro e novamente
grávida, apanhava calada. Foi por esta época que conheceu Mãe Nachel, a famosa
cartomante, vidente, mãe de santo. Ela fez um despacho e Valdo sumiu, ou
melhor, assumiu de vez Dona Kéca, uma viúva ricaça já na terceira idade e foram
viver no exterior.
         O
tempo passou, as muitas feridas cicatrizaram, Mãe Nachel virou Vovó Nachel e um
dia profetizou o mês, o ano, o dia em que a procura de Vanilda teria fim e este
dia é hoje.
         O
estranho sorriu e quando seus olhares se tocaram Vanilda soube que ele seria o
último homem de sua vida. Maria Navalha tentou segurar a barra, mas Vanilda
rompeu todas as barreiras, sentou no colo, fez carícias ousadas sem ligar para
a reprovação dos demais frequentadores do barzinho. Conquistara a sua presa,
saíram para os finalmente…
         Cidade
pequena, o acontecimento raro pegou a todos de surpresa e todos ouviram
atentamente; – Alo! … Atenção! … As 23; 45 horas da noite de ontem, foi
encontrado próximo à barragem, com sete perfurações a faca, uma direta no
coração, o corpo de Vanilda Gorda. Seu assassino fugiu, é um psicopata
procurado em todo o país. Solicitamos que as senhoras obesas usuárias de
calcinha tipo fio dental, se mantenham em casa, são estes o fetiche que atraem
o matador. Obrigado… Alo! … Atenção! …
         Vanilda,
a musa do barzinho que frequento, estava certa. O estranho seria o último homem
da sua vida, o que lhe daria paz, o príncipe que a libertaria da solidão…
Vovó Nachel acertou o mês, o ano, o dia do fatídico encontro… Maria Navalha
chora… A cidade amanheceu triste!
Gastão Ferreira/2012  

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