UMA GATA CHAMADA BEBÉL…

            Ela me
encontrou na academia de ginástica. Adentrou o recinto e ficou sobre meus pés
na esteira onde me exercitava. O rapaz da limpeza a levou para fora do
prédio… Ela voltou, peguei-a no colo e olhei seus olhos amarelos… Fui
adotado na hora!
         Uma
gatinha preta, um novelo de lã escura que não miava… Junto a meu peito
chegamos a casa, imediatamente percorreu todos os cômodos, cheirou os cantos
das paredes, andou pelos terraços, bebeu leite e dormiu no tapete da sala como
se a casa lhe pertencesse… Fui ao mercado e comprei ração, dois potes, um
para água e outro para alimento. Seu nome? Bebél. A protagonista da novela das
nove daquela época.
         Bebél
tinha menos do que dois meses de vida, uma cruza de gato persa com qualquer
coisa, pois, não miava, no máximo fazia um “´éh… éh”… De uma limpeza
exemplar, fez suas necessidades numa caixa de areia por quinze dias e depois
sempre fora de casa. Costumava me presentear diariamente com baratas, depois
com camundongos pegos no terreno frente a casa. Excelente caçadora, a noite
subia no telhado, moro num sobrado, capturava garças, marrecas, saíras, sabiás,
canários, pardais… Bote certeiro, além dos ágeis beija-flores, um dia me
presenteou com um lagarto de meio metro de comprimento, não me perguntem como
escalou o muro de quatro metros de altura com o bicho vivo na boca!
         Adorava
dormir nos pés da cama, quando mocinha preferiu se mudar para o sofá da sala.
Gostava de passear a noite e fazer companhia ao padeiro da panificadora Iguapan,
no térreo do prédio. Nunca roubou um pão, um bife, uma comida de sobre a
mesa… Uma lady gata! Jamais ficou doente. Mostrou-se uma excelente mãe de
filhotes saudáveis.
         Curtiu
com desvelado amor cada filhote de suas cinco gestações, ensinava a caçar
capturando pássaros e ratos, e, soltando-os no meio da ninhada. Brincava o
tempo todo com a filharada, sofria com a separação… Nunca presenciou uma
doação e talvez por isso ficou dias e dias procurando pela casa o filhote
sumido e chamando por ele. Não se conformava com facilidade, sofria e ficava
deitada no fim da escada como a esperar um retorno… Na última ninhada, para
evitar tanto sofre, fiquei com Léu, um gatinho que aos quinze dias de vida já
me reconhecia… Que decepção! Herdou da mãe a adoração por mim e mais nada. Um
gato bagunceiro que escolheu a escada como latrina, com um miado forte que faz
questão de exibir a cada cinco minutos, mexe em tudo, dorme sobre o teclado do
computador, no guarda-roupa, na estante de livros, dentro de armários. Madrugador
me obriga a levantar da cama arranhando a porta do quarto ou escalando a tela
da janela até conseguir seu intento… Um amor de gatinho! Fiquei com um
monstro que me ama e adora abraçar minhas pernas para ser arrastado pela casa.
         Bebél
era possessiva. Não me dividia com ninguém… As inúmeras visitas ficavam
fascinadas com a belíssima gata preta que não desviava os olhos por um segundo
da minha pessoa e seguindo meus passos pela casa. Aceitava e dava carinho aos
visitantes, na rua era arredia e não se aproximava de ninguém. Desde pequena
tentava me seguir quando eu saia de casa. Quantas vezes eu voltei para que ela
não se perdesse!
         Bebél se
ausentava a cada duas horas… Ao voltar pedia carinho tocando levemente em meu
corpo com sua patinha direita, caso não obtivesse atenção, tentava com a
patinha esquerda e com seu miado característico, éh… Éh. Certificada de que
eu estava bem, desaparecia novamente, eu era o seu filho mais velho, acho eu!
         Apesar
de tanto chamego não perturbava, bastava passar a mão sobre sua cabeça e depois
coçar seu queixo para que se sentisse feliz… Gostava de me ver escrever,
fazer palavras cruzadas. Ficava longo tempo olhando a caneta correr sobre o
papel ou fingindo ler junto comigo. Não interferia na hora das refeições, a não
ser que tivesse frango frito, era fissurada em frango frito, afinal, frango é
uma ave… Não comia peixe, somente ração.
         Esse ser
vivo que me adotou, deu-me momentos felizes. Gostava que eu, como filho mais
velho, tomasse conta de seus filhotes… Confiava em mim, nunca me arranhou,
mordeu ou destruiu algo dentro de casa. Muitas vezes largava os filhotes para
deitar a cabeça sobre meu colo, num abandono que não sei explicar. Caso
estivesse fora da casa, bastava gritar seu nome umas três vezes que aparecia na
hora.
         Com
quatro anos de vida, no auge da beleza felina, Bebél foi assassinada… Foi
caçar passarinhos na vizinhança e nunca mais voltou… Seu filho Léu entrou em
desespero, não quer ficar sozinho um minuto, não permite que eu me afaste de
seu olhar, cruza as patinhas em volta do meu tornozelo, parece sentir a
ausência da mãe…
         Os
animais são os seres mais próximos de Deus; um presente do Criador para aliviar
nossa solidão, dissipar nossos pequenos e grandes dissabores. Obrigado Bebél
por ter feito parte de minha vida… Que no teu Céu possam existir pássaros de
todas as cores e que tenha sonhos felizes… Eu e Léu sentimos a tua falta!
Gastão Ferreira/Iguape/01/08/2011   
                                                                                

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