UM MILAGRE DE SANTA DOROTÉIA…

         Dona Nandi
vivia de antena ligada, tudo culpa de seu filho Alberto Roberto. No sitio onde morava,
o garoto, costumava aprontar poucas e boas. Maquiador de primeira, costureiro
de mão cheia, gostava de usar os vestidos das colegas nas festas e quermesses
do bairro. Ótimo cozinheiro, excelente doceiro, um ator nato, pois mudava o
timbre da voz a seu bel prazer, de mãos inquietas e olhares calientes brincava
de viver… A coisa ficou feia ao querer trocar de nome. Alba Nery!
         – Meu
Bonje! De onde Alberto Roberto tirou este nome estrangeiro? Será que está
doente? Vou levá-lo ao curandeiro do bairro e saber o que se passa, se propôs
dona Nandi.
         Na
consulta, o famoso benzedor examinou detidamente o moleque e disse taxativo; -“
É bicha minha senhora!”…  Dona Nandi,
mais sossegada, deu um bom vermífugo ao menino e continuou tocando a vida.
         Enquanto
isto, num outro bairro rural, dona Ziloca também passava por poucas e boas com
sua pequena Maribel. A menina, desde o berço, mostrava um comportamento de
veras estranho. Adorava caçar animais silvestres, era raro algum tateto escapar
de seus tiros certeiros. Para fazer um roçado não existia melhor pessoa. Exímia
pescadora, pintora e pedreiro nas horas vagas, Maribel só tinha um defeito aos
olhos de sua mãe dona Ziloca; – Não arrumava namorado!
         Por uma
destas casualidades sem explicação, coisas do destino como diriam os antigos,
dona Ziloca resolveu comprar um bode para fazer companhia e outras coisinhas a
sua jovem cabra Lucibeth, aumentar de vez o plantel e dar inicio a produção de
queijo de leite de cabra. Pois não é que dona Nandi estava se desfazendo do
jovem bode Neratti, a preço de banana. O tal bode havia atacado uma meia-irmã,
uma prima e uma tia dentro de sua própria família caprina. Era causa de
escândalo no sitio e os crentes da nova igreja “Jesus Perdoa, mas não esquece”,
exigiram a morte do bode pecador. Um dos irmãos da nova igreja indicou dona
Ziloca como possível compradora, pediu 30% na transação, alegando que o jovem bode
Neratti daria um bom reprodutor caso o pastor não conseguisse que a irmandade o
matasse.
         Foi
assim que dona Nandi e dona Ziloca se tornaram amigas ao amarrarem o destino do
bode Neratti com o da cabra Lucibeth. Como não só de rezar vive o povo, com o
tempo, ambas começaram a comentar sobre seus problemas particulares, seus
sonhos e surgiu a história dos filhos e filhas que não conseguiam casar. Dona
Ziloca que aparentava ser a mais esperta, pois era uma micro empresária, militante
atuante na área de defesa dos Bagres Africanos no entorno do lagamar e mata
atlântica. Uma ongueira de cabeça aberta e ligada na preservação dos prédios
tombados em permanente ruína…
         Dona
Ziloca descobriu o culto a Santa Dorotéia… Bastava à pessoa participar da
procissão, vestida com a roupa que julgava ser a mais apropriada a sua maneira
de viver, que a felicidade batia a porta… Tiro certeiro, sem promessas
esdrúxulas, sem sair definitivamente do armário, a outra metade da Jaca se
faria presente.
         Segunda
feira de carnaval! Dezessete horas, sete mil pessoas lotavam as muitas ruas do
velho centro histórico…  Santa Dorotéia
e seu banho! Alba Nery, num esvoaçante vestido semitransparente, com um grande
e belo chapéu onde uma maquiagem perfeita delineava a perfeição de um rosto
feminino no verdor dos anos, sentiu um baque! Uma emoção que a fazia tremer por
inteiro… Um maravilhoso homem, um jeca caipira de olhar brejeiro o chamava
para sambar… Alba Nery não estava mais sozinha, achara um homem prá chamar de
seu… Que se dane a sociedade, as aparências… Só a felicidade interessa.
         Sambou,
bebeu, se divertiu… Apaixonou-se. Agora é à hora da verdade, de tirar a
máscara, de saber qual o recheio. O jeca caipira estava fascinado, muitos
beijos rolaram, Alba Nery era definitivamente a mulher de sua vida. Será que
ela toparia levar a serio um relacionamento; – Oh minha santa Dorotéia!
Ajude-me a ser feliz.
         Sentados
num banco do jardim da orla, olhos nos olhos, o caipira falou:- “Alba Nery!
Nunca conheci alguém como você. É a primeira vez que me apaixono, parece que
fomos feito um para o outro… Não sei como dizer, mas não sou o que você
pensa… Peço que me desculpe! Uma mulher linda como você Alba se entregando a
um pobre sitiante como eu…”
         – Também
eu estou apaixonado, falou Alba Nery. Não sei qual será a sua reação, mas seja
qual for, quero que saiba que eu não menti, estas últimas horas foram as mais
felizes da minha vida… Meu nome não é Alba Nery, moro num sitio próximo e me
chamo Alberto Roberto… Adeus meu amor!
         – Volte
Alberto Roberto, meu nome é Maribel e também moro num sitio… Você é a mulher
pela qual procurei a vida inteira…
         – E você
Maribel é o homem com o qual sonhei para ser feliz…
         Foi
neste momento que ocorreu mais um milagre de Santa Dorotéia. Maribel, tomando
as mãos de Alberto Roberto, perguntou; – “Alba Nery! Você aceita ser minha
namorada?”
Gastão Ferreira/Iguape-2012
        
Obs.- Foi este um dos muitos milagres ocorridos
durante o banho da Dorotéia… Maribel casou com Alberto Roberto / O bode
Neratti foi viver com a cabra Lucibeth / Dona Nandi e dona Ziloca estão
namorando firme… É isto aí! É a Vida…
             
        

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