MEU NOME É LÉU…

                Meu nome é Léu… Vi o que eles fizeram ao casal de
velhos e de como saíram impunes do crime praticado. Vovó Maricota era
aposentada, trabalhou como enfermeira padrão, criou os filhos e nos finais de
semana recebia os netos e bisnetos em sua casa simples, mas confortável. Seu
Pedro também aposentado tinha como passatempo fazer entalhes em madeira,
gostava de presentear com pequenos objetos de sua lavra aos visitantes mais
chegados.
            Vovó Maricota era uma dessas almas generosas, talvez
devido a sua profissão e por ter partilhado de tanto sofrimento não conseguia
ficar calada perante a dor alheia. Auxiliava a vizinhança pobre nas horas da
necessidade com remédios, roupas, pequenos favores nunca devolvidos.
            Naquela noite Sapinho tocou a campainha… Sapinho era um
garoto de onze anos muito apegado a dona Maricota. Vovó não sabia que o guri
era usuário de crack.
            Sapinho morava com sua avó dona Matilde desde que seu pai
Jessé “dedos rápidos” assassinara a sangue frio um vigia noturno. Sua mãe
Anabela arranjou novo companheiro, largou a criança na casa da sogra e caiu no
mundo com seu amor bandido. Dona Matilde aposentada como pescadora sem nunca
ter visto de perto uma tarrafa, uma rede, um peixe vivo dava ao menino além de
seu amor tudo o que sobrava de seus parcos recursos. Sapinho era inteligente,
um chantagista emocional nato, acusava a avó pelos pecados do pai e assim
conseguia suas roupas e tênis de marca. Aos sete anos começou a cometer
pequenos furtos, experto nunca se deixou apanhar…
            A cola de sapateiro foi seu primeiro passo dentro do
mundo sombrio das drogas e dela pulou direto para o crack… Os amigos de seu
pai deram uma força ao garoto que distribuía o produto entre os usuários sem
levantar suspeitas. Também era o olheiro da quadrilha. Quem desconfiaria de um
menino e seu inseparável skate sapeando as casas e os hábitos dos moradores,
por isso o apelido Sapinho. 
            Quando vovó Maricota foi à cozinha preparar um lanche ao
garoto que se dizia faminto, ele abriu a porta aos comparsas que barbarizaram o
casal de velhos. Seu Pedro foi torturado até mostrar aos bandidos onde escondia
suas economias e morreu com várias facadas no coração, vovó foi degolada com um
único golpe. A casa depenada, os objetos de valor sumiram, o dinheiro
desapareceu…
            Pela manhã os vizinhos estranharam a porta aberta,
chamaram a polícia. Sapinho estava vendado, amordaçado e amarrado na cozinha em
meio ao sangue de vovó e seu Pedro. Pobre criança que trauma poderia advir do
que presenciara! Os repórteres não podiam mostrar seu rosto, ele era menor de
idade, mas sua silueta chorava emocionada ao contar que os bandidos invadiram a
residência no momento em que dona Maricota, sua amiga, preparava um
lanchinho… Tão boa a dona Maricota que tantas vezes matara sua fome! Que
tristeza! Que covardia!
            Meu nome é Léu… Sou o gato de vovó Maricota. Eu sei…
Eu vi.
Gastão Ferreira
             

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