KIZOMBA – O APRENDÍZ DE FEITICHEIRO

            Em algum lugar perdido em meio à savana africana, onde
nenhum homem branco, amarelo, vermelho ou azul se aventurou, os atabaques
chamavam:- Venham amigos! É hoje o grande dia, o destino de Kizomba será
revelado ao mundo.
            Exu, o mensageiro divino cortou céus e terras avisando os
quatrocentos irun imole do orun e os duzentos igbá imolo do aiye sobre o
evento.
            Ogum trouxe fogo, Oxossi a caça, Logunedé peixes, Xangô
justiça, Obaluaiye remédios, Oya Iansã acalmou os ventos, Oxum trouxe ouro,
Iemanjá fertilidade, Nanã esqueceu a morte, Yewa trouxe beleza, Obá amor, Oko
produtos agrícolas, Ibeji alegria, Dadá Ajaká suas artes. Ifá,
Odudua, Obatalá, Oranian,
Olokun, Olossa, Oxalufan, Oxaguian, Orumilá vindos diretamente do orun
dirigiram-se ao conselho de feiticeiros.
            Todos os deuses e deusas do orun (céu) e do aiye (terra)
estavam curiosos para saberem sobre o destino de Kizomba, pois o mesmo desde
muito jovem clamava aos deuses e demônios a troco de nada. Pagava o preço de
seus feitiços mal feitos em doenças, desavenças, amores mal resolvidos, caspa,
seborréia, chulé, furúnculos, gripe, mal olhado, boqueira, mau hálito e
centenas de males que infernizavam sua vidinha.
            Kizomba era um artista nato, chorava, ria, cuspia tudo ao
mesmo tempo e fazendo caretas. Era um ser fragmentado em dezenas de personagens
conflitantes, um camaleão humano e os deuses estavam propensos a calarem tal
aberração.
            Os feiticeiros interrogaram Kizomba sobre seus
conhecimentos mágicos e concluíram que ele era apenas mais um pidão, ou seja,
um incomodador de deuses e demônios:- Mata aquela mulheeerrr! Tire o marido
daquela Zinha! Faça aquele ali perder o ganha pão!
            Findo o teste ficou evidente que Kizomba não tinha a
mínima moral para ser feiticeiro e o informaram disso. O bicho pegou feio,
Kizomba gritou, esbravejou, falou mal, rogou praga, rodou a baiana, a carioca e
a mineira.
            Exu resolveu interferir, consultou Ifá o orixá do destino
e pessoalmente falou a Kizomba:- Por teu comportamento irreverente frente aos
homens mortais e as falsas juras em nome dos deuses eternos, eu Exu, o senhor
de todos os caminhos, mensageiro divino dos oráculos e voz dos deuses,
determino; – Será um feiticheiro! Sim enquanto não te voltares para o bem será
conhecido como um fede nem cheira um feiticheiro!
            Assim Kizomba vagou pelas terras dos yorubás até o fim de
seus dias. Como feiticheiro retorna ao aiye reencarnação após reencarnação em
busca do aprendizado de amor ao próximo e a si mesmo. Se um dia conseguir
superar o orgulho, a vaidade, a arrogância e a maledicência, o bom Oxalá irá
libertá-lo de sua sina maligna e reconduzi-lo ao orun.
            Segundo informações altamente sigilosas conseguidas em um
local apropriado, Kizomba melhorou bastante nessa sua última vinda a Terra,
agora escreve sátiras e faz uns versinhos e leva pedradas de todos os
aprendizes de feiticheiros que cruzam seu caminho, creio que é parte da
maldição de Exu. Sarava Exu!Guardião de todos os caminhos.
Gastão Ferreira

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