A REVOLTA…

         A noticia estava em todas as redes sociais, internet,
jornais e revistas. Nunca na história da humanidade ocorrera algo assim,
pássaros em revoadas sobre uma pequena cidade durante vinte e quatro horas
consecutivas… As ruas, os telhados, os pátios das casas estavam cobertos de excrementos,
as pessoas que ousavam sair de seus lares eram atacados pelos dejetos das
avoantes. As lojas, bares, padarias e supermercado fecharam temporariamente. As
entregas estavam suspensas, ninguém arriscava enfrentar os perigos que rondavam
pelos ares. Os animais domésticos, cães e gatos, estavam agindo de maneira
estranha. Uivavam, latiam, miavam dia e noite… Uma loucura sem explicação.
         Técnicos em zoologia e ornitologia, em trajes especiais, analisaram
as possíveis causas do fenômeno. Descobriram que o epicentro da ocorrência
partia dos arredores da velha cidade, exatamente de uma pequena cachoeira localizada
num local conhecido como Itaguá… Infiltraram um especialista em linguagem
animal que aos poucos foi decifrando a causa em questão. Segue abaixo o
relatório dos fatos com as devidas observações expurgadas do jargão técnico.
         “Os cientistas há muito descobriram que os animais se
comunicam entre si. Recentemente a língua animal foi descodificada e decifrada.
Sabemos muito bem o que um cão quer comunicar a seu dono, o que um pássaro
anuncia com seu canto, o que um gato quer dizer com seus miados e ronrons. Nos
diálogos gravados constatamos que os animais e pássaros que vivem na pequena
cidade estavam estressados, que por diversos meios tentaram se comunicar com os
humanos e expressar a causa do descontentamento. Partiram para o confronto
quando chegaram à conclusão que jamais seriam entendidos.
         O motivo básico da revolta foi devido a grande queima de
fogos de artifícios, os famigerados foguetes festivos. Na vetusta cidade todo e
qualquer acontecimento é comemorado com rojões, bombinhas, foguetórios. Raro o
dia em que meia dúzia de foguetes não desfaz a calma, o sossego, a tranquilidade
do lugarejo. Pássaros no choco abandonam os ninhos, cachorros perdem o faro,
gatos tentam inutilmente fugir do barulho, todos têm os tímpanos feridos. Tanto
isto é verdade que a maioria dos cães deita no meio das ruas e não notam a
aproximação dos veículos. Alguns gatos de uma hora para outra esquecem o
próprio nome e não atendem ao chamado dos donos, tudo isto é devido à surdez
causada pelos altos decibéis emitidos pelos famigerados rojões.
         Sem ter a quem recorrer, pois os humanos se negam a prestar
a mínima atenção a seus rogos, recorreram aos macacos, os parentes mais
próximos da raça dos homens. Os primatas bolaram a revolta e enquanto não parar
o terrível foguetório a cidade será bombardeada diariamente com a única arma
que os pássaros possuem; – O coco!
         Recomendamos que as autoridades competentes atuem o mais
rápido possível no sentido de coibir o uso excessivo de fogos de artifícios. O
mundo evoluiu e hoje entendemos que o planeta é de todos os seres vivos e que
animais também merecem respeito… Assinado: Técnico responsável.”
         A cidade após a proibição da usança de rojões voltou à
rotina e a pouco um passarinho pousou numa pitangueira no quintal de minha
casa. Agora já sei que eles falam e nos entendem; tentei um contato de primeiro
grau… Ou o pássaro é um dos surdos pelos antigos foguetes, ou é abobado…
Olhou bem para a minha cara, pulou para o galho mais alto da árvore e antes de
alçar voo respondeu; – Bem te vi!  
Gastão Ferreira/2012   
        

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