SEM ORDEM NEM GRESSO

Presídio de segurança máxima

         Naquela
cidade distante, tão perto do mar, o bicho estava pegando; político mandando
bala em festa popular, gente com diploma superior matando cachorro a pauladas,
marido matando esposa, amante estapeando ex-amante, anônimos trucidando gatos,
troca de favores e favores em troca, muito dinheiro desaparecendo e virando prédios,
clubes particulares, fazendas, carros de luxo, plásticas e botox… Coisas que
só acontecem em terra de gente honesta e de bem com a vida.
         A
população revoltada com tanto descaso entrou em greve; fecharam as entradas de
acesso à cidade, o pescador não pescava e o pedreiro não comparecia na obra, garota
de programa não programava e o turista não passeava, e, para piorar a situação faltaram
fogos de artifícios e rojões; foi à gota d’água! Como viver sem barulho?
Naquela cidade distante era Deus no céu e foguete na Terra e ajam rojões!
         Através
da internet mensagens foram trocadas com os poderes superiores; a solução
encontrada foi à construção de um presídio de segurança máxima na cidade. Um
prédio antigo, próximo a um campo de futebol, foi desapropriado por cinco
milhões de Reais e com urgência urgentíssima e sem licitação, a faraônica obra
estaria pronta em poucos meses.
         Na
planta, o edifício teria cinco andares, o quinto andar reservado aos políticos;
com elevador privativo, sala de massagem, sauna, podólogo, barbearia, área de
recreação, restaurante e cozinha com nutricionista. Seriam quinze suítes no
total; cinco femininas (já se sabia de antemão quem ocuparia as suítes) e treze
masculinas (com possibilidade de colocação de três beliches por suíte, caso
todos os podres da politicagem local fossem descobertos e julgados), as suítes
estavam voltadas para o mar e as visitas íntimas liberadas vinte e quatro
horas.
         O
quarto andar seria reservado aos que possuíam diploma superior; a alimentação
fornecida por um famoso e caro self-service. Aos prisioneiros seriam negados
aparelhos de tevê com menos de cinquenta polegadas. Visitas apenas na parte da
tarde e sem direito a pernoite. Os quartos com banheiros estavam voltados para
a montanha.
         O
segundo e terceiro andar seriam reservados como área de lazer; frigobar, churrasqueiras,
biblioteca, solário com piscina e caixas eletrônicas vinte e quatro horas. O
térreo e o primeiro andar seriam áreas de segurança e serviços; ali ficariam os
garçons, cabeleireiras, manicures, moto boys e lobistas para eventuais
contatos.
         Nos
dois andares do subsolo ficariam os detentos comuns; os assassinos, os
pedófilos, os agiotas (aqueles que emprestam dinheiro a juros e juram que não
emprestam), os ladrões de bicicleta, botijões de gás, assaltantes, passadores
de drogas e outros, pois a lista é imensa… A alimentação seria fornecida por
Dona Aninha- “Comida Caseira- Baratinha da Tia Aninha”; a R$2,50 a marmita. Os
vigias e responsáveis pelo presídio também ficariam nos subsolo; o diretor e
assessores trabalhariam na cobertura do prédio, com vista para o mar, as
montanhas e o heliporto.
         A
maquete da obra foi apresentada a população, ninguém questionou o óbvio; pois
se todos os prisioneiros eram ladrões, qual o porquê do tratamento
diferenciado? O foguetório ficou na história, espetinho de carne e frango à
vontade, cerveja em lata e muita caipirinha de pinga. Todas as autoridades
discursaram emocionadas; um vereador de outra cidade matou a tiros vinte e
cinco pessoas, usou uma metralhadora; ciúmes da moderna obra? Foi o que
afirmaram! … Até o momento ninguém foi preso… Na festa Pedro brigou com
Paulo por causa de Maria e Maria esbofeteou Luana por ciúmes de Andréia;
Andréia ama Virginia e Beth, mas detesta Maria que nem imagina que Pedro tem um
caso com Paulo… Duzentos papelotes de cocaína e trezentas pedras de crack
foram aprendidos com Janjão do Bode… Cinco meninos da melhor idade assediaram
seis meninas da menor idade e duas viúvas arrumaram marido… Grande festa!    
         Até
o momento o prédio não saiu do papel; parece que o dinheiro sumiu e ninguém
sabe e ninguém viu! O povo está feliz; tem foguetes e não tem médicos. Nas ruas
da cidade, tarde da noite ou em plena luz do dia, figuras carimbadas e usuárias
de drogas encostam velhos, senhoras e moças contra os muros e pedem cinquenta
centavos para comprarem pão… A cidade, tão perto do mar, continua sem ordem e
nem gresso!
Gastão Ferreira/2014
              

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