ESPIONAGEM NORTE-AMERICANA EM IGUAPE

         O fato
passaria despercebido não fosse por Dona Zica Mironga, aquela simpática senhora
que dia e noite permanece atenta na janela a espiar o que ocorre na vizinhança,
que reparou num urubu voando em zigue-zague por sobre a cidade. Contou ao filho
Jawilson a respeito da ocorrência e o garoto passou a seguir atentamente o voo
do abutre.
         Aquela
ave não agia em conformidade com as outras do bando, não abria com as garras e o
bico os sacos de lixo, não perseguia cães e gatos, ao anoitecer não voltava
para as montanhas. Plainava altaneira sobre a cidade e num piscar de olhos
locomovia-se de um lugar para outro como um corisco.
         Jawilson,
muito esperto e observador, notou que o urubu tinha algumas preferências…
Espiava o Paço Municipal, a egrégia Câmara Municipal no decorrer das sessões
semanais… Era como se bisbilhotasse algo. A noite se empoleirava no alto da
torre da igreja matriz e seus olhos brilhavam nas trevas, pareciam filmar o que
ocorria no entorno da praça.
         Com os
preparativos para a grande festa do santo protetor, cavalos e cavaleiros, motos
e motoqueiros, romeiros e pedintes, barraqueiros e pessoas desconhecidas
vagavam pela cidade… Muitos rojões anunciavam a proximidade do evento, cada
grupo soltavam foguetes marcando sua presença frente à basílica.
         Jawilson
mirou no abutre e disparou o rojão, acertou a ave em cheio… Sorrateiramente subiu
pela escadaria que conduz ao campanário, jogou dentro de uma sacola o que
restou do urubu e foi correndo para sua casa examinar o exótico pássaro que
parecia feito de plástico.
         Dona
Zica Mironga, acostumada com fatos inusitados vistos de sua janela, jamais
imaginou um avoante sem penas, sem carne. Assustou-se com a quantidade de molas
e parafusos, a bateria de lítio que movia a estranha máquina feita à semelhança
de um urubu… Jawilson explicou que o objeto era um robô e mostrou para sua
mãe um pequeno pen-driver embutido por trás dos olhos da criatura… Boa coisa
não devia ser! Que será que o bicho gravara?
         O rapaz
introduziu o pen-driver no computador… Que pena! O rojão havia danificado o
sensível equipamento; – “Repara mãe! Esse ali não é o senhor…”, “Meu Bonje!
Ele está carregando uma pasta negra na calada da noite… Será que é dinheiro
para pagar aquele bando de garotas que até hoje não receberam pelo árduo
trabalho prestado?… Não! Não!… Olha! Olha! Está distribuindo dinheiro para
aquelas pessoas em volta da mesa… Que droga! A imagem desapareceu…”, “Mãe!
Repara na nota de prestação de serviço… Parece aquela que vi na
internet!…”… “Não acredito! O quê Tigrinho, tão honesto, está pondo no
bolso? Parece dindim…”, “Calma mamãe! Esqueceu que a senhora é crente e que
não devemos julgar para não ser julgado? Aquele ali não é o senhor Sabiá? O
arrependido!… Esse menino vai longe! Tem a quem puxar… Porcaria de filmagem
mal feita! Não posso reconhecer quem foi filmado…”, “Repara filho! São
imagens da famosa passeata… Repara na garota toda maquiada, se achando a
última manjuba do Ribeira, fotografando os participantes e anotando seus nomes
num papel… Quem será a lambisgóia?”
         Dona
Zica Mironga e seu filho Jawilson viram coisas jamais imaginadas. O arquivo abrangia
vinte anos de paciente filmagem… Muita gente se achando o máximo, muita gente
se perdendo, se corrompendo, se vendendo, se alugando, sofrendo perseguições,
lambendo feridas e não aprendendo nada de edificante sobre honestidade, ética,
moralidade… Mãe e filho descobriram que o urubu era simplesmente uma máquina
de espionagem do governo norte-americano… Sacana esses americanos! Pena que o
equipamento esteja tão danificado, tornando impossível o reconhecimento dos
envolvidos nas filmagens… Meu Bonje!
Gastão Ferreira/2013
            
        
        

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