A MOÇA DO CEMITÉRIO

CONSTANTINE

            Início do século XX, em
Iguape, as pessoas ouvem deslumbradas as recentes notícias de novas invenções;
avião, luz elétrica, automóvel. Miguel Antonio, um jovem de dezoito anos,
romântico e sonhador, era um apaixonado por novidades e sonhava com o progresso
chegando a sua pacata cidade.

         Miguel Antonio
era destemido e valente; um dos poucos que saiam à noite sem temer lobisomem,
mula-sem-cabeça, saci, carruagem fantasma, procissão dos mortos, homem da capa
preta, cavalos fantasmas e outras visagens que infestavam Iguape naqueles bons
tempos. Na verdade ninguém entendia o porquê de um vivente sair para a
escuridão; ainda não se consumia maconha, cocaína e crake, as sombras eram de
uma chatice sem fim.

         Dona
Esmeraldina era a única pessoa que sabia o motivo das escapadas noturnas de
Miguel Antonio; ele estava apaixonado. Tia Meralda, apelido carinhoso de Dona
Esmeraldina, era cartomante, benzedeira, egiptóloga, taróloga, icaparóloga,
vidente e muito mais… O garoto estava amando a quem não devia!
         Desde
o nascimento Miguel estava prometido a sua prima Márcia Thereza, rica herdeira
da família Alvarenga Joio, uns cinco anos mais velha e feia feita assombração.
Miguel Antonio acreditava no amor verdadeiro e o encontrou nas tardias horas
noturna na doce figura de Constantine; uma garota pálida como a lua, doce como
mel, linda como uma rosa recém-entreaberta (realmente o jovem estava de veras
apaixonado!).
         O
que mais chamava a atenção em Constantine além de sua excessiva palidez era
certa tristeza no olhar. A única vez em que Miguel Antonio conseguiu segurar
suas delicadas mãos sentiu que eram frias. A moça era cheia de segredos; só
aparecia depois da meia noite, não dizia o nome dos pais nem onde morava e jamais
permitiu que Miguel a conduzisse ao lar, que ficava para o lado do Valo Grande
em direção ao prédio da indústria Matarazzo, puro matagal. Trajava sempre a
mesma veste, um vestido branco e uma mantilha que a protegia do frio noturno.
         Esse
namoro durou uns três meses. Miguel queria conhecer os pais de Constantine, ou
pelo menos saber onde morava a eleita de seu coração. Por diversas vezes seguiu
de longe a sua amada, mas sempre a perdia de vista e foi por esse motivo que
consultou Tia Meralda, a vidente. Que foi clara e precisa; – “Mulher quando não
quer dar endereço, alguma coisa está escondendo! Muito cuidado meu filho…
Siga a moça mais de perto e vai entender o que eu digo.”
         Miguel
conseguiu roubar um primeiro beijo de sua amada, coisa rara naqueles tempos em
que beijar era tabu; a moça ficou muito magoada com o roubo do primeiro beijo e
disse que não mais poderiam se encontrar, que aquele beijo era proibido para
ela e saiu correndo, aos prantos. Miguel desesperado seguiu o conselho de Dona
Esmeraldina e foi atrás da fujona, descobriu que Constantine passava por dentro
do cemitério municipal para chegar ao local onde morava.
         Pela
manhã Miguel decidiu refazer o percurso da fuga; ao passar por entre os
túmulos, sobre uma campa estava à mantilha da amada e na lápide escrito; – Aqui
jaz Constantine Prado (+ 10.08.1880) e (- 15.02.1895). Miguel Antonio nunca
mais saiu à noite, casou com Márcia Thereza de Alvarenga Joio, mas jamais se
esqueceu de Constantine, a garota do cemitério.
Gastão Ferreira/2013    
        

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