Fabinho, um menino caiçara
– Mestre Fabio Silva –
Nessa
paragem os formadores de sambaquis viveram por milhares de anos, os índios
guaranis costumavam pescar em seu lagamar, piratas, flibusteiros, desbravadores
passaram por aqui; espanhóis, lusitanos, alemães, gente vinda de lugares
distantes compõem a árvore genealógica do icaparano Fabio Silva.
Sua
tataravó de origem indígena vivia livre na Serra dos Itatins, seu bisavô foi o
engenheiro prussiano Dr. Ferdinand Von Gothard que veio da Alemanha em meados
do século XIX, o sangue dos seus ancestrais traz o sobrenome “Franco”, e se
mistura com o dos pais fundadores do bairro que deu origem a cidade de Iguape; Icapára
é um bairro que ainda preserva todos os costumes de uma alma caiçara antiga, um
lugar onde todos cuidam da vida de todos, uma herança dos tempos de dantes…
Icapára
tem muitas histórias, o bairro foi atacado por piratas, por índios, fez guerra
com São Vicente, o famoso Bacharel de Cananéia passou um tempo no local, e
dizem que escondeu um fabuloso tesouro até hoje oculto; lobisomens, sacis, encantados
das matas, visagens e almas do outro mundo compõem as suas lendas urbanas…
Fabio
Silva e seus seis irmãos nasceram e cresceram no bairro de Icapára, seus pais
José Ferreira da Silva e sua mãe Maria das Dores Silva são caiçaras raízes…
Ele nasceu em 1982, naquela época todas as ruas do bairro eram de areia, as
casas eram ligadas por trilhas, e não possuíam muros.
Vida
boa de inocente menino criado sem televisão e sem celular; banho no lagamar, ou
na lagoa da pedreira, escorregar no areão do Morro do Cajuvá, pescar no Porto
do Eloi, saltar da Prancha, brincar de vira-canoa… Comer no pé a pitanga, a
amora, a goiaba madura…
A
rivalidade entre a turma do Borui e do Valinho (uma divisão tipo rua de cima
contra rua debaixo) não impedia o jogo de taco, brincar de polícia e ladrão,
armar arapuca e fazer laço para sabiá, prender gambá, pular amarelinha…
Assistir sem medo e cheio de esperança a chegada do futuro.
Primário,
ensino médio, faculdade de Ciências Biológicas, aprendeu o básico do entalhe em
madeira com mestre Lucênio Bezerra de Vasconcelos, e virou autodidata; suas
obras levaram o seu nome e o nome de Iguape para a Itália, Alemanha e diversos
Estados do Brasil… Atualmente atuando como professor de ciências só faz
entalhes e cestaria de fibra como passatempo, ou por encomenda quando
procurado.
O
moço Fabinho tinha sonhos filantrópicos; fundaram uma ONG voltada para as
atividades de subsistência caiçara, para a pesca artesanal, hortas
comunitárias, aproveitamento das frutas da região, araçá, goiaba, amora,
pitanga para doces e compotas… Por politicagem, a ongue está dormindo.
O
menino caiçara casou com a professora Fabiana e tem um filho, o Bernardo, e que
diz ser o pai Fabinho o seu melhor amigo, pois é com ele que aprende o nome das
árvores, dos pássaros, dos animais que vivem na Mata Atlântica. É também com
ele que compartilha as muitas caminhadas nas matas, as pescarias, os passeios
de bicicleta, os jogos de antigamente…
Fabio
montou um espaço para a prática do jiu jitsu, o CT Toca da Raposa, que por um
bom tempo foi apenas filantrópico, um endereço criado para afastar a molecada
do celular, das drogas, das ruas… Hoje
em dia também tem alunos que pagam.
Alma
de escritor tem muitas poesias inéditas, é um cronista amador apaixonado pela
cultura caiçara, pelos pássaros, pelas matas, por tudo o que diz respeito ao
progresso de nossa Iguape, com muitos projetos aprovados na área cultural, fez
parte do grupo que incentivou a criação da “festa da tainha” do Icapára, de
alguns blocos carnavalescos, do incentivo ao turismo ecológico, conhece as
ervas medicinais e a serventia das madeiras da Mata Atlântica; seu lema é viver
e deixar viver, colher apenas do que plantar…
Prestem
atenção, Fabio Silva, o nosso menino caiçara faz a diferença, ele conhece a
alma de nosso povo, sabe onde a dor se faz doedor, já provou da maldade e da
bondade que nos cercam, e o futuro dar-me-á razão; um mestre está em gestação, e
quem viver verá.
Gastão Ferreira/2021/Iguape
Gastão Ferreira começou a publicar seus textos aos 13 anos. Reconhecido por suas crônicas e poesias premiadas, suas peças de teatro alcançaram grandes públicos. Seus textos e obras estão disponíveis online, reunidos neste blog para que todos possam desfrutar de sua vasta e premiada produção.