A prisioneira

 

         A
princesa Yasmim Al Farah Rachid, filha do xeique Ahmed Al Farah Rachid, nasceu
em um berço de ouro; a criança da realeza era embalada num berço de ouro maciço
cravejado de diamantes, tinha ao seu dispor três amas de leite, e cinco camelas…
Cresceu no Palácio Real.

 

         Palácio
Real árabe é pura ostentação e luxo; com suas duzentas suítes, dezenas de
salas, cinco cozinhas, várias piscinas, três haréns, um para cada etapa da
vida; harém das virgens, das semi-usadas e das descartadas… A mãe de Yasmim,
uma das odaliscas descartada, e desaparecida misteriosamente do iate nababesco
durante uma viagem da Família Real à cidade do Rio de Janeiro, Brasil.

 

         O
xeique estava dando uma festa em seu mega-iate, e contratou as passistas de uma
escola de samba. Durante a folia a bela princesa Yaslim, mãe de Yasmim se
engraçou com um tocador de tamborim e fugiu com ele para uma favela; o xeique
só descobriu a fuga dois meses depois quando Yasmim deu falta da mãe, e
perguntou por ela.

 

         Yasmim
era uma princesa infeliz; que amolação escolher o traje matinal entre cinco mil
vestidos, as jóias de uso diárias entre dez mil adereços de ouro, prata e
pedras preciosas… Uma canseira! O café da manhã algo estafante; trinta tipos
de pães, quarenta qualidade de sucos, queijos dos mais variados, frutas de
todos os países da Terra, e cinco eunucos para servir o desjejum…

 

         A
princesa sentia-se uma prisioneira, quando viajava era vigiada por seguranças o
tempo todo, os carros eram blindados e com vidros escuros, e nos passeios a
burca chamava a atenção dos passantes, mas ninguém via o seu rosto; a maquiagem
perfeita, as vestes caríssimas vindas de Paris, os balangandãs de ouro e
platina escondidos pela negra burca… Que infelicidade, quanto sofrimento!

 

         Yasmim
ficou sabendo que sua mãe vivia com um pobre nativo afro descendente num morro
na Cidade Maravilhosa; pobre, mas fogoso e amável. O casal sobrevivia vendendo doces
árabes, esfirras, kaftas, e pedras que não eram pedras…

 

         A
princesa muito mimada, mas muito esperta, bolou um plano de fuga; seu pai foi
convidado para uma conferência em Buenos Aires, capital da Argentina… Era a
chance de Yasmim fugir, e conquistar seu lugar no mundo.

 

         A
garota se abarrotou de jóias, vestiu sua roupa mais humilde; um vestido Dior de
trinta mil dólares. Durante a vistoria de seu pai ao consulado de seu país, ela
foi ao banheiro, retirou a burca e escapuliu pela porta dos empregados
nativos… Era noite.

 

         Yasmim
entrou numa Casa de Tango, e pediu asilo ao proprietário; El Cantador, o jovem
dono da espelunca se comoveu com a história da garota, ela se comunicava num
péssimo inglês, mas as jóias diziam tudo o que ele queria saber… Escondeu a
moça em seu barraco na periferia da cidade, e bolaram uma rota segura para a
fuga…

 

         El
Cantor se mostrava apaixonado, Yasmim acreditou; vendeu as jóias, o vestido
Dior, e compraram uma humilde pousada em Florianópolis. A princesa acorda cedo,
faz o café da manhã, limpa a casa, dá comida para o cachorro, lava a roupa, vai
ao mercado fazer as compras do dia, e capricha no almoço do maridão… O
maridão, El Cantante, acorda às onze da manhã, e passa à tarde na praia com os
amigos portenhos; volta bêbado, bate na esposa, chuta o cachorro, e dorme sossegado,
todos os bens do casal estão em seu nome…

 

         Yasmim
que se achava uma prisioneira no Palácio Real, agora sabe o que realmente é ser
uma prisioneira no mundo real, e também sabe que ela não tem para onde fugir.

 

Gastão Ferreira/2021

 

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