Maria Fininha e o
lobisomem

 

 

 

         Eu estava num beco sem saída; tinha a
certeza de que tio Anselmo era o lobisomem que atacara madrinha Maria Fininha,
eu sabia que a dinda era apaixonada pela besta fera, mas eu não podia trair a
confiança de meu amado tio, a situação era de vera complicada.

 

         Fiquei uma semana na cabana da
floresta, só eu e tio Anselmo, ele estava febril devido ao ferimento na testa;
que homem bom, coração generoso, um tanto tímido. Uma noite abriu sua alma,
contou que tinha um segredo; gelei! Será que ele finalmente me revelaria que
era um lobisomem?

 

Que nada! O que ele contou era um segredo bobinho, ele
desde moleque era apaixonado por minha madrinha Maria Benedita, aliás, foi ele
quem insistiu com a minha mãe Dirce Gambá para convidar Dita Sílfide para me
batizar, e ele e ela foram os meus padrinhos.

 

         A timidez foi a culpada dele jamais se
ter declarado à sua musa; devido a um problema que o afligia uma vez por mês,
resolveu abandonar a pequena cidade, e tentar esquecer aquele amor impossível…
Que tragédia! Jamais deixara de amar Dita Sílfide, mesmo agora que ela era
conhecida como Maria Fininha, a louca paixão persistia…

 

         Eu não sabia qual atitude tomar, tio
Anselmo permaneceu acamado, o ferimento era realmente bem feio; muitas vezes
ficou febril, e chamava por Maria Benedita… Foi difícil para eu tomar uma
decisão acertada, mas enfim escolhi o amor; aquele lindo amor entre meus
padrinhos não poderia morrer… Fui visitar dinda Fininha.

 

         Cheguei sem rodeios e fui falando; –
“Sei quem é o nosso lobisomem, e também sei da grande paixão que ele nutre há
muito e muito tempo pela senhora; ele é apixonado pela dinda desde menino…”

 

         – “Não me diga! Alguém que foi a vida
inteira apaixonado por mim… E por que o abestado nunca se declarou?”

 

         – “Timidez, madrinha, timidez! A
senhora era tão bela, e ele era um moço comum… Tinha medo de ser recusado,
apontado como um jacu, um bicho do mato, um Zé Ninguém…”

 

         – “Meu Deus, Zequinha Guaiamu! Fala
logo quem é a figura, tenho medo de que ao saber eu permaneça apaixonada apenas
pela besta e não pelo homem… Fala guri!”

 

         – “É o tio Anselmo, madrinha! Pronto,
falei!”

 

         – “Anselmo Garnisé, o homem mais lindo
da cidade! É muita areia para o meu caminhãozinho…”

 

         – “A senhora está mais para uma jamanta
do que para um caminhãozinho, dinda!”

 

         – “Bem que eu notava as caras e bocas
do Anselmo, mas ele tinha muitas fãs, todas as filhas da alta sociedade, e eu
tão pobre…”

 

         – “Bobagem! Foi ele quem insistiu com a
mamãe para lhe convidar para me batizar, assim ficariam mais próximos…”

 

         – “E agora, o que eu faço? Atiro-me em
seus braços, digo que conheço o seu negro segredo? Que faço, o que faço?”

 

         – “Ah, o amor! Ele não sabe que nós
sabemos que ele é um lobisomem, e acho que nem deve ficar sabendo… Que tal a
senhora dar um pulinho na cabana, chegar chegando para uma visita, e deixar as
coisas acontecerem? Hem, hem?”

 

         – “Para um moleque de treze anos você
está muito esperto, guri… Vamos que vamos, e sem revelar os segredos!”

 

         Acompanhei madrinha Maria Fininha até a
cabana da floresta, entrei sozinho na choupana e disse ao tio Anselmo que ele
tinha uma visita… A dinda entrou, os negros olhos de tio Anselmo brilharam na
semi-escuridão da cabana…

 

         Ficaram ali os dois olhos nos olhos,
com a respiração acelerada, corações palpitando, mãos trêmulas, sorrisos
fugidios; tio Anselmo foi o primeiro a recuperar a fala; -“Maria Benedita, Dita
Sílfide, há quanto tempo não nos vemos menina!”

 

         – “Dita Sílfide faz tempo que me
deixou, sou agora uma mulher com 135 quilos, mais conhecida como Maria
Fininho…”

 

         – “Maria Fininho, Dita Sílfide… Não
importa, no meu coração só existe a Maria Benedita…”

 

         Saí à francesa, encostei a porta da
cabana, chamei o cachorro Perdido e fomos espiar um ninho de sabiás, os
filhotes estavam famintos… Ah, o amor! Um dia eu também vou conhecer um amor
assim.

 

 

Gastão
Ferreira/2020

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