A FUGA DOS ESCRAVOS
MUITOS E MUITOS ANOS APÓS A REDESCOBERTA, PINDAÍBA TRANSFORMARA-SE NUMA PRÓSPERA FREGUEZIA. FOI O FAMOSO CICLO DO OURO. AS DONDÓCAS DA ÉPOCA SALPICAVAM OS CABELOS COM O PÓ DO PRECIOSO METAL PARA MOSTRAREM QUE NÃO ERAM APENAS UMAS INÚTEIS, MAS TAMBÉM MUITO RICAS E A FIM DE DAR O GOLPE DO BAÚ EM ALGUM OTÁRIO OU TURISTA ESTRANGEIRO. FOI UM PERÍODO DE FAUSTO, OPULÊNCIA E DE TERRÍVEIS CAÇADORES DE ESCRAVOS FUGITIVOS.
POR ESSE TEMPO EXISTIAM ESCRAVOS PARA TUDO, ERAM CONSIDERADOS ANIMAIS MÁQUINAS, SEM SENTIMENTO, SENSO MORAL OU HONRA. FAZIAM O SERVIÇO BÁSICO; – CARREGAR PENICO, LIMPAR BUNDAS SUJAS, LEVAR RECADOS PARA AMANTES, NAMORADOS E SUSPEITOS. PODIAM SER ESTUPRADOS, AÇOITADOS E ESPANCADOS POR QUALQUER NINHARIA E HAVIA ATÉ LIVROS ENSINANDO COMO MALTRATAR UM ESCRAVO SEM PROVOCAR ÓBITO. AS MAL AMADAS E FEIAS DIVERTIAM-SE TORTURANDO BELAS AFRICANAS. GOSTAVAM DE PRATICAR SUAS ARTES APÓS A MISSA DIÁRIA, POIS COMO ESTAVAM SEM PECADOS E PURAS, NADA COMO UMA MALDADEZINHA COM UM ANIMAL FALANTE PARA COMEÇAR BEM O DIA.
OS CORONÉIS, MAJORES E CAPITÃOS MANDAVAM NA VILA E CONSIDERAVAM OS MORADORES LOCAIS COMO SEUS BICHOS PARTICULARES. ERAM OS DONOS DO PEDAÇO, OS MANDATÁRIOS, OS QUE DETINHAM O PODER DE VIDA E MORTE. A FILA PARA O BEIJA-MÃO ERA LONGA. COSTUME ESSE QUE PERDUROU NO TEMPO, BASTA NOTAR COMO A MAIORIA DAS PESSOAS ADORA PUXAR SACO DE QUEM SE JULGA PODEROSA. OS CORONÉIS, QUASE SENHORES FEUDAIS, CASAVAM SEUS REBENTOS ENTRE OS PRÓPRIOS PARENTES PARA NÃO DIVIDIREM A FORTUNA AMEALHADA COM TANTA MARACUTÁIA, O QUE ERA ÓTIMO, POIS EM DUAS OU TRES GERAÇÕES TODOS OS DESCENDENTES APRESENTAVAM PROBLEMAS MENTAIS, DETONAVAM OS BENS HERDADOS E ERAM DEFINITIVAMENTE ESQUECIDOS.
A GENTE MIÚDA, COMO ERA CHAMADA OS SEM TÍTULOS, TRABALHAVAM PRÁ CACETE, ALGUNS PRODUZIAM AGUARDENTE, OUTROS PINGAS E MUITOS OUTROS CACHAÇA. PINDAÍBA PROSPERAVA. UM GÊNIO, DESCENDENTE DE QUARTA GERAÇÃO DE UM PODEROSO CORONÉL DEU A MAGNÍFICA IDÉIA DE UNIREM UM GRANDE E CAUDALOSO RIO, PRÓXIMO A VILA, COM O LAGAMAR. COMO A MÃO DE OBRA ESCRAVA ERA BARATA, OS TRABALHADORES NÃO GANHARIAM NADA. A COMIDA NA REGIÃO ERA MUITO FARTA, CAJAMANGA, BOLINHO DE RODA, MANJUBA, BAGRES, TATÚ, PORCO DO MATO, AIPIM, FARINHA DE MANDIÓCA, TUDO COMIDA DE POBRE E PARA QUEM RECLAMASSE DA EXCELENTE ALIMENTAÇÃO, CHICOTE NO LOMBO E PELOURINHO PARA APRENDEREM A RESPEITAR QUEM OS TRATAVA COM TANTO AMOR E CONSIDERAÇÃO.
OS ESCRAVOS, COM SUÓR, LÁGRIMAS E ESPANCAMENTOS, ABRIRAM UM INSIGNIFICANTE VALINHO DE DOIS METROS DE LARGURA POR TRES QUILÔMETROS DE COMPRIMENTO AO LARGO DA VILA. NA CONCLUSÃO DA OBRA UMA FESTANÇA COM FOGUETES, TAINHAS ASSADAS NA FOLHA DA BANANEIRA, CASADINHO DE MANJUBA, CAMARÕES, MUITOS DISCURSOS E CACHAÇADA. OS ESCRAVOS FICARAM NUM LOCAL MAIS AFASTADO PARA NÃO PERTURBAREM SEUS SENHORES COM PEDIDOS DE RESTOS DA FARTA COMILANÇA.
ESTAVAM TODOS DANÇANDO E CANTANDO AO SOM DE RABÉCAS QUANDO O TEMPORAL COMEÇOU. OS ESCRAVOS, PREOCUPADOS COM A SAÚDE DE SEUS AMOS TORRADOS, OS CARREGARAM PARA SUAS BELAS CHÁCARAS. CHOVEU PRÁ DEDÉU E O VALINHO DE DOIS METROS PASSOU A TER TREZENTOS METROS. MUITAS CASAS, BOIS, CACHORROS, PORCOS, GALINHAS, MACACOS, TAMADUÁS E FORMIGAS, ASSIM COMO CATIVOS GENTILMENTE ACORRENTADOS EM SENZALAS FORAM PARA O BELELÉU. TODOS OS ESCRAVOS FORAM ESPANCADOS POR NÃO ENTENDEREM DE ENGENHARIA E DAÍ PARA FRENTE PROIBIDO POR LEI DE ABRIREM ATÉ MESMO UM INSIGNIFICANTE POÇO CASEIRO.
COM O ALARGAMENTO DO VALINHO MUITOS POBRES MORRERAM OU PERDERAM SUAS RÚSTICAS MORADIAS, MAS COMO POBRE NÃO FAZ FALTA, NINGUÉM LIGOU, E, EM CASO DE RECLAMAÇÃO MANDAVAM SE QUEIXAR AO BISPO. COMO O BISPO MORAVA LONGE E TAMBÉM NÃO DAVA A MÍNIMA PARA POBRE, A VIDA CONTINUOU A MESMA PORCARIA DE SEMPRE.
DE UM DIA PARA O OUTRO PINDAÍBA AMANHECEU SEM ESCRAVOS. TODOS OS CATIVOS DESAPARECERAM. AS MADAMES NÃO SABIAM COMO ARRUMAR UMA CAMA, TOMAR BANHO, COZINHAR, LIMPAR A CASA OU FAZER TODAS ESTAS COIZINHA QUE QUALQUER RAINHA DO LAR, POR MAIS MEDÍOCRE QUE SEJA, FAZ DANDO RISADINHAS DE ALEGRIA. AS SENHORAS RESOLVERAM FICAR NA JANELA AGUARDANDO O RETORNO DOS FUGITIVOS, E É POR ISSO QUE ATÉ HOJE VEMOS TANTAS MULHERES ESPIANDO POR JANELAS E PORTAS, COMO NÃO SABEM FAZER NADA NA VIDA, ESTÃO ESPERANDO A VOLTA DAS ESCRAVAS, TAMBÉM CONHECIDAS COMO DIARÍSTAS OU EMPREGADAS DOMÉSTICAS.
(NÃO LEVEM A MAL:- QUALQUER SEMELHANÇA É MERA COINCIDÊNCIA)
GASTÃO FERREIRA/2009/IGUAPE
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Gastão Ferreira começou a publicar seus textos aos 13 anos. Reconhecido por suas crônicas e poesias premiadas, suas peças de teatro alcançaram grandes públicos. Seus textos e obras estão disponíveis online, reunidos neste blog para que todos possam desfrutar de sua vasta e premiada produção.