Num reino muito distante chamado Pindaíba, em um tempo em que os bichos falavam viveu uma rainha conhecida como a Bonsa (bondosa soberana). A soberana foi assim apelidada por sua incrível ingenuidade e por acreditarem que ela era levada no bico por alguns de seus cortesãos.
O tal reino já fora famoso por ser governado por um rei que andava nu. Sim! Aquele mesmo que foi enganado por dois alfaiates espertalhões (Devenus & Bidú), que convenceram o tolo monarca que só os bons, honestos e puros de coração poderiam admirar a belíssima veste real por eles criada, até que o rei caiu na real porque um moleque de rua apontou o dedo e gritou:- O rei ta nu! O rei ta nu!
O rei morto de vergonha, não por desfilar pelado em seu reino, mas porque durante os passeios ganhara a alcunha de o “mínimo” (não sei por quê?), mandou açoitar o menino dedo duro, o expulsou do prézinho e exilou sua numerosa família numa vila nos cafundós do diabo.
Mas isso são águas passadas, voltando ao que interessa. A plebe vil amava de coração sua bondosa rainha, mas como toda a plebe que se preza em todos os tempos e em todos os reinos, não perdia ocasião de fofocar e em por defeito em tudo, e, a Bonsa (bondosa soberana) e sua corte eram o prato predileto dos fuxicos dos súditos.
A Bonsa tinha grande afinidade moral e intelectual com alguns nobres que a auxiliavam na condução dos negócios do reino. As bocas malditas do povinho os chamavam de “os meninos da rainha”. Tudo o que a Bonsa resolvia executar, consultava “seus meninos”, que por sua vez consultavam tarôs, búzios e mães de santo.
Um dos meninos era conhecido como “a jóia”, não que fizesse júz ao cognome, mas porque se achava a coisa mais linda, divina, fofa e inteligente do universo. Era um prato cheio para os futriqueiros de plantão que lhe rogavam pragas, maldições e piadinhas que faziam o regalo dos pobres e miseráveis que eram maltratados pela geniosa criatura.
“A jóia”, servil e amável com os poderosos, e irascível e desaforado com os menos favorecidos e subalternos, em tempo passado fora conhecido como “o joio” (dicionário Aurélio-sm= erva tóxica que medra no meio do trigo). Ninguém sabe como a maleável figura ganhou acento no novo reino, isto é, de joio virou jóia. Coisas de poderes sobrenaturais!
“A jóia” tinha muitos planos e o principal deles era tornar-se o herdeiro presuntivo do trono e tentava de todos os modos possíveis e impossíveis ser adotado de fato pela Bonsa.A plebe, sempre o povinho intrometido! Não concordava com os tenebrosos e maquiavélicos planos da “jóia”, não que soubessem quais era as tais artimanhas, mas conhecedores do seu próprio povo temiam que no final “a jóia” poderia usar de meios poucos ortodoxos, tais como enfeitiçar a rainha (feitiços e bruxos eram comuns em tal época) e quem sabe após conseguir seus propósitos envenená-la, como acreditavam que já o fazia lenta e constantemente.
Pois não é que a plebe vil acertara na mosca, digo na “jóia”. O menino procurou uma famosa e temida feiticeira que se escondia em um bairro muito pobre do reino e ofereceu-lhe mundos e fundos (e ponha fundos $$$ nisso) para que a sibila (nome bonito para bruxa) resolvesse seu problema. No escuro chegaram a um acordo e a medeia (outro nome bonito prá feiticeira) convenceu “a jóia” a tomar a sua famosa porção mágica “como tornar-se um rei num piscar de olhos”. Esperto como só podia ser uma jóia falsa, a “jóia” emborcou o líquido e morreu na hora.
Imediatamente a mãe de santo, digo sibila, ligou para a rainha informando que mais uma pedra, “jóia”, havia sido removida de seu caminho e que os astros continuavam a iluminar o reino, o qual seria longo e benévolo a população, e, insinuando que a soberana poderia nomeá-la para o cargo recém vago.
A rainha agradecida enforcou a feiticeira e contratou outra sibila para dar jeito no restante dos meninos. Ninguém soube ninguém viu. Na verdade a rainha não era nada boba e ficou só na moita aguardando os acontecimentos e como era também conhecida por “toda amor”, não queria manchar as mãos reais com sangue vil, mas que contratou a feiticeira para o serviço sujo, contratou. A história original foi preservada na íntegra e pode ser consultada no volume II de “Lendas de Pindaíba”.
Gastão Ferreira/Iguape/SP-2009
Gastão Ferreira começou a publicar seus textos aos 13 anos. Reconhecido por suas crônicas e poesias premiadas, suas peças de teatro alcançaram grandes públicos. Seus textos e obras estão disponíveis online, reunidos neste blog para que todos possam desfrutar de sua vasta e premiada produção.