CAFÉ COM LULA

CAFÉ COM LULA

Numa cidade muito distante, nos confins do Brasil, pólo turístico e cultural invejável. Cujos dirigentes eram pessoas educadas e amadas por seus concidadãos. Um paraíso na Terra, onde ninguém era perseguido e a imprensa livre para manifestar suas opiniões, ocorreu um fato inusitado que marcou profundamente a história da longínqua e rica cidade.
Os preparativos para uma grande festa estavam concluídos. Os estoques de foguetes vistoriados, seguranças contratados entre os amigos, discursos decorados. Foi quando a notícia vazou:- Lula tomaria um café por ali!
Foi um Deus nos acuda! Cinco bispos correram à cidade. Três governadores comunicaram com urgência urgentíssima que fariam questão de prestigiarem a festança e que trariam consigo centenas de prefeitos de seus estados.
Reservas de hotéis, feitas com antecedência de meses, foram canceladas na marra em favor das autoridades visitantes. Os melhores restaurantes ficaram a serviço dos excelentíssimos e suas portas, por ordem dos donos da cidade, vigiadas para que nenhum pobre ou curioso soubesse o que os manda chuvas comeriam e beberiam de graça.
Os setecentos mendigos vindos unicamente para achacarem romeiros foram levados para local ignorado e após régia gratificação conduzidos a uma cidade próxima onde ocorreria outra festividade. Aos quarenta moradores de rua, hóspedes permanentes do município, ofertaram um “luau” forçado em uma praia num leste distante, afastando-os definitivamente do centro e arredores da urbe.
Um habitante da localidade, cuja finíssima educação fora cantada em prosa e verso em todos os jornais regionais! Um tipinho grosseiro e caipira que nunca tinha saído além das fronteiras do município, mas que se achava à cereja do bolo foi convidado a recepcionar o presidente.
Na noite que antecedeu a festa houve toque de recolher, pois no dia seguinte o “homem” estaria por ali. A garotada do mal foi confinada em suas casas com a promessa solene de que após as festividades poderiam detonar o que bem quisessem como sempre faziam e sem cobranças.
Graças ao Bom Protetor a população ao menos uma vez na vida atendeu aos apelos da autoridade, pensando mais no bem estar de todos do que em si mesma. As menininhas boas como sempre não reclamaram e ficaram rezando em suas casas. As más, as freqüentadoras de forrós, danceterias e barraquinhas mal afamadas tentaram uma revolta contra a autoridade. A autoridade, com todo o amor do mundo acabou com a alegria das garotas do mal, informando que se não cumprissem o solicitado todas as espeluncas da cidade seriam vistoriadas e fechadas após o término dos festejos. Foi só por isso que colaboraram, pois certamente ponderaram:- O que é uma noite sem esbórnia, sem porre, sem gritos na rua, sem drogas, comparada com o restante do ano!
Ao alvorecer do esperado dia foi tão intensa a foguetada que até hoje os urubus não retornaram a seus ninhos nas montanhas. Onze horas da manhã e o visitante não comparecia. O povão na espera. Romeiros se babando, de olho num sonhado beija mão. Turistas ávidos por turistar, mas na expectativa. Todos com suas melhores roupas e melhores sorrisos. Milhares de pessoas comportadas frente às autoridades sentadas sob luxuosos palanques armados ao redor da praça.
Um único bêbado chamava a atenção dos presentes. O tipinho grosseiro que fora contratado para os salamaleques oficiais, foi tirar satisfação:- Cretino! Gentalha! Eu mando te matar! Onde foi que você bebeu se EU proibi bebidas alcoólicas por 24 horas antes de o ilustre chegar?
– Ah seu tipinho!Eu bebi na barraca “Café com lula”.
– Café com lula?
– Sim! Uma barraca de lona velha e suja perto da entrada da cidade.
– Meu Protetor! Como vou explicar a todo esse povo que tudo foi um engano! Algum gaiato viu o nome da barraca:- Café com lula e saiu por aí dizendo que Lula vinha tomar um café na festa, que será de mim?Oh xente!(Esqueci de informar que a cidade era na Bahia) Que vexame! Salvem-se quem puder que o bicho vai pegar, gritava histérico para os convidados.
Essa festa ficou para a história. Foi à única na velha cidade baiana em que os mendigos não importunaram os romeiros. Todos os visitantes se comportaram como pessoas civilizadas e todos os participantes levaram como recordação gratuitamente pedaços das luxuosas acomodações oficiais que restaram da pancadaria. Para os habitantes ficou uma lição:- Povo unido jamais será vencido!

GASTÃO FERREIRA/2009
Obs.:- Esse texto é totalmente fictício. Qualquer semelhança (aliás, nem existem semelhanças!) com a realidade é mera coincidência.

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