Will o pirata…

BELADONA…

         Há
muitos e muitos anos, quando o mundo era ainda inocente surgiu à lenda um
grande corsário. Um impiedoso pirata que sistematicamente atacava as costas e
as frentes do continente sul-americano… Seu nome era Will Wilsonson, o terror
dos mares, o flibusteiro que em sua nau de negras velas raptava mocinhas
sonhadoras as margens dos rios e nas praias desertas de outrora.
         O
flagelo dos mares, pela enésima vez atacara a incipiente Vila de Icapara. Os
caiçaras choraram o ouro perdido, os jovens as noivas levadas para longe de
seus beijos e abraços, os velhos as filhas que jamais teriam de volta.
         Will
ficou feliz. O porão do navio repleto pelo saque, desta vez conseguira rapinar
sessenta sacas de farinha de mandioca, duzentos odres da famosa pinga “Camisa
Vermelha”, cem fardos de tainhas defumadas, trezentos cachos de banana nanica,
muitas esteiras de pirí, oito dançarinas de cancã, três cabeleireiras, cinco
manicures, dez garotas de programa sem programa, uma cantora de fados e a filha
do alcaide, a formosa Beladona, que por si só valia por todo o butim.
         Beladona
era a única filha do alcaide Alberico Flor Roxa Junior, Flor por parte da mãe, Roxa
por parte de pai e Junior para ninguém desconfiar que pudesse ser filho de
outro pai. Seu Berico nas horas vagas fazia rosas roxas da Patagônia para
ofertar as menininhas tolas da terceira idade como paga de algum favor
prestado. O nascimento da garota estava envolto em mistérios, dizem as boas e
más línguas que Flor Roxa encontrou uma sereia desmaiada na praia e abusou
sexualmente da mulher-peixe. Resultado? A belíssima Beladona.
         Beladona
tinha um probleminha, apesar da beleza estonteante emanava um pitíu, um
cheirinho de peixe herdado da mãe e por onde passava atraía um monte de gatos
famintos. Fora este pequeno problema era a perfeição em carne e osso, mais
carne do que ossos é óbvio. Wilsonson, como todo o bom corsário adorou o
perfume exótico exalado pela donzela.
         Will
vendeu o produto do saque aos índios Nocupirus, descendentes dos Maias e que
pagaram horrores pelas jovens mulheres sem pechinchar, pois estavam para
inaugurar uma novidade vinda da Europa, um lugar sossegadinho dentro da
floresta para portugueses, espanhóis, franceses e holandeses se divertirem,
chamado “Zona da Mata” e estavam com falta de mão obra especializada. O capitão
pirata só não se desfez de Beladona.    
         O
temível corsário estava apaixonado por Beladona e pirata com paixonite não é
fácil. Pela primeira vez na vida caiu na real, fez a barba, penteou os cabelos,
trocou de roupas e passou perfume no corpo todo. As garotas raptadas contaram a
história de Beladona e pediram segredo, incluindo o bodum de peixe que só
pescador gripado aturava. Will, esperto como só um malvado pirata pode ser, em
vez de perfume passou sardinha em lata pelo corpo e talvez seja esta a razão
pela qual Beladona se entregou tão fácil a seus tórridos beijos.
         Numa
noite, a pedido de Beladona, todos os marujos foram colocados em um bote e
abandonados numa praia deserta… Na nau ficaram a sós Will e Beladona. Estavam
num nhéconhéco prá lá de sacana quando o navio foi cercado pelo povo do mar.
Tubarões, baleias, orcas, ouriços do mar, leão marinhos, pinguins, salteiras,
manjubas, todos comandados por sereias e tritãos. Era a mãe de Beladona que
viera salvar a filha das garras do inimigo humano e Will pertencia a raça dos
homens, a raça daquele Flor Roxa que abusara da pequena sereia desmaiada, com
fome e sede numa praia deserta.
         Ninguém
sabe ninguém viu, mas a nau pirata jamais foi avistada. Conta à lenda que
Beladona descobriu ser a sua mãe uma rainha do mar, herdeira do trono das
sereias e não se tem ideia de como conseguiu salvar Will Wilsonson da vingança
materna. Muitos marujos dizem avistar o navio pirata nas noites de calmaria e
que Will, metade homem e metade peixe, abraçado a Beladona lhe acena de longe,
feliz da vida.
         Alguns
anos após esta epopeia apareceu na pequena Vila do Icapara um garoto vindo do
mar. O estranho é que perguntou por Alberico Flor Roxa Junior, a quem chamou de
vovô, disse que se chamava Will Alberico Wilsonson Junior. Trouxe consigo
moedas de ouro muito antigas, pérolas do mar mais profundo e exalava cheiro de
peixe… Quem será?
Gastão Ferreira/2012    

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