Coisas nossas…

O COMÍCIO…

A cidade tem seus encantos e desencantos. Muitas festas, quermesses, procissões e uma queda especial por rojões. Tem o “Alo! Atenção!… Nota de…” que possui o poder de imobilizar qualquer cidadão em curiosa expectativa para saber quem finalmente partiu para o outro lado.
Alguns costumes estão por demais enraizados e o imenso progresso dos últimos tempos não conseguiu empaná-los. É o caso dos comícios. Adoramos comícios! As mães levam os recém-nascidos, as crianças suas brincadeiras, os pais os filhos, a vovó o vovô, o namorado a namorada, os candidatos suas latinhas de cervejas e espetinhos de carne nos porta malas dos carros. Os cachorros seguem os donos e as ruas ficam desertas.
Frente ao palanque as bandeiras tremulam… Gritos de incentivos… Palmas e foguetes e mais foguetes… Muita música, som altíssimo, impedindo que se preste a devida atenção às propostas de governança. A duas quadras antes do tablado as pessoas espiam e comentam a chegada de cada candidato e sua equipe de campanha… Na área circunscrita entre o palco e o bar, sempre tem um bar nas proximidades de um grande comício, circulam os olheiros do adversário… Seu trabalho é anotar quem são as traíras, os falsos, as duas caras que vivem de favores, os traidores.
Os contratados para prestação de serviço durante a campanha eleitoral ficam concentrados frente ao palanque, os familiares e cabos eleitorais ocupam as laterais frente ao palco e os simpatizantes são aqueles que aparecem nas fotos. A maioria dos candidatos à vereança expõe ao povo a razão pela qual se fazem presente ao evento, ou seja, declina o próprio nome, o nome do pai, da mãe, do avô… Afirmam seu desvelado amor pela cidade e juram trabalhar com honestidade e desvelo pelo progresso do município.
O comício mais aguardado durante a campanha eleitoral é o da Barra do Ribeira. O bairro Barra do Ribeira fica a trinta quilômetros da sede do município. É nesse encontro que as famílias se reveem, mata a saudade, a comadre visita a outra comadre, o tio revê os sobrinhos, o afilhado ganha um presente da madrinha e todos põem as fofocas em dia. Uma belezoca!
Vinte ônibus participam da romaria. Alguns coletivos levam somente a irmandade evangélica, vão orando e cantando hinos religiosos durante o percurso. Nos ônibus dos “torrados” os alcoólatras não anônimos bebem moderadamente. As garotas da melhor idade, sessenta e setenta anos, se divertem pondo defeitos nas ingênuas e tolas mocinhas da pior idade, ou seja, as gurias de quinze a dezoito anos. Os meninos maus, os nóias, as meninas espertas seguem em outros ônibus em que ninguém sabe o que pode acontecer, teve vez que o ônibus foi depredado. Tem gente que leva até o cachorro, o passeio grátis só ocorre de quatro em quatro anos. Ainda não reservaram um coletivo para os pedintes, acho que mendigo não vota, sei lá!
Na chegada a Barra do Ribeira uma multidão recepciona os candidatos, muitos fogos de artifícios, os visitantes procuram os parentes, os jovens seus colegas, as periguetes seus periguetes, os crentes seus templos, os cervejeiros os inúmeros bares e os políticos fazem seus discursos para meia dúzia de ouvintes e ao final das falas aceitam participar de uma tainha assada na casa de alguém que aposta na vitória do candidato e está doidinho para ganhar um cargo na futura administração.
Na volta com horário marcado os motoristas esperam pacientemente pelos passageiros, os que prestaram serviços entram nos micro-ônibus, os candidatos e familiares em seus carros, alguns bajuladores pegam caronas nos automóveis e a maioria do povo reclama do atraso na partida. Fim de mais um comício na Barra do Ribeira, excursão grátis só daqui a quatro anos… Aguenta coração!

Gastão Ferreira/2012

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