Meu piano… Meu tesouro!

TEMPOS MODERNOS

Antigamente a vida era um osso duro de roer, tão duro que aos vinte e poucos anos de idade as pessoas estavam banguelas de tanto roeram ossos… Veio daí o costume da doação de dentaduras em ocasiões especiais, tal costume continua válido e atuante até os dias de hoje.
As maiorias das casas eram simples e humildes, feitas de taipa e cobertas de sapé. Com o tempo chegaram às novidades, as habitações dos mais favorecidos passaram a ter beirais no final do telhado. A plebe ficava horas admirando a inovação e pensando; – “Como que essa coisa não despenca na cabeça de alguém?”
Os muito, muito ricos, a fim de se diferenciarem dos menos abastados, inventaram as eiras só para sacanear os invejosos que adoravam copiar as inovações e não tinham grana para tanto. A pior das ofensas era; – “Vossa Mercê não possui nem eiras, nem beiras!” e o apântropo caia no choro.
Cidade portuária comercializava com o mundo… A riqueza fluía, o medo dos piratas, dos corsários, dos ladrões, dos bandoleiros e pidões de favores forçaram os senhores de eiras e beiras a criatividade. Passaram a enterrar seus tesouros em lugares especiais. Faziam um mapa do local e quando necessitavam desenterravam o dito cujo. Como era impossível cavar um buraco sem que um curioso ficasse espiando e espalhando pela freguesia a novidade, os poderosos acertaram em guardar suas joias e o seu ouro nas paredes dos casarões. Para tanto deslocavam uma pedra e utilizavam o buraco como cofre…
Muitas casas foram desmanteladas em busca de supostos tesouros. O roteiro era o de sempre; – Uma visagem aparecia a um pilantra qualquer e apontava o esconderijo. Quando o dono da herdade viajava, o esperto e honesto sonhador entrava na casa e demolia a parede… Muitos esqueletos de desafetos foram assim descobertos.
Depois da invenção dos cofres bancários tudo mudou. As paredes conheceram uma novidade chamada reboco e os buracos secretos foram desativados. Algo que chamava a atenção era que nem todo o ouro poderia ser guardado no Banco. Aquele dinheiro vindo da ladroagem, da corrupção, das falcatruas, dos assaltos ao erário, àquela grana sem justificativa legal passou a ser escondida no colchão. Nos testamentos antigos os herdeiros ficavam na maior expectativa para saber com quem ficaria o colchão do coronel.
Na atualidade tais praticas são motivos de riso e piadas. Pelo que se sabe ninguém enterra tesouros em fundo de quintal, nem em buracos nas paredes ou no porão da casa… Hoje quem tem eiras e beiras, e, pratica a gatunagem, esconde o dinheiro rapinado no piano… Não estranhe se ouvir alguém comentar; – “Meu piano! Meu tesouro.”

Gastão Ferreira/2012

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