Olho no olho…


O OLHAR DA MEDUSA

Medusa era uma das Górgonas (Esteno, Euríale, Medusa), a única mortal entre as três irmãs filhas das divindades marinhas Fórcis e Ceto. Fora outrora uma belíssima donzela, que se orgulhava principalmente de seus cabelos, mas se atreveu em competir em beleza com Palas Atenas, a deusa privou-a de seus encantos e transformou as lindas madeixas em hórridas serpentes.
Medusa tornou-se um monstro tão cruel, de aspecto tão horrível que nenhum ser vivo podia fitá-la sem se transformar em pedra. Ao ser decapitada por Perseu, de seu sangue nasceram Pégaso, o cavalo alado, e, o gigante dourado Crisaor.
Medusa faz parte do mito, odiava o homem mortal simplesmente por ser ele o que era. A Medusa está entre nós… Espia-nos nas festas, nos bares, nas igrejas, nas calçadas, nos carnavais da vida. Lança sobre nós seu desamor, seu pensamento destrutivo, sua própria dor.
A Medusa moderna não suporta ver gente feliz, tem seus olhos voltados para a escuridão moral e sempre encontra motivo para críticas entre os eventos humanos.
O sonho de Dona Maria Marola era que a filha Tayanna Crislaine fosse destaque na Escola de Samba “Sereia do Mar Pequeno”… Era um desejo acalentado desde os tempos de mocinha, naquela época quase foi a principal atração da famosa Escola, mas o amor que sentia por Teodobaldo impediu a realização de sua maior fantasia e Tay já estava a caminho… Coisas de Festa de Agosto!
Crislaine foi criada desde o berço para realizar o intento da mãe. Aprendeu a dançar “na boquinha da garrafa” antes de falar papai e mamãe… Cantava com entusiasmo as belas e complicadas letras dos famosos blocos carnavalescos “o Boi”, “o Litro”, “os Cachorrões”, “o Gato Preto”, “o Tatu” e dos famigerados e bagunceiros “Filhos da Béti”, um bloco onde os participantes repetem o estranho refrão; – “Quem mamou, mamou! Quem quer mamar, não vou deixar.”… O único problema era que Tayanna Crislaine era pobre e Francine Adrielle rica… Quem era Fran Adrielli?
Francine Adrielli era filha de dois semideuses locais. O pai Dito Preguiça, funcionário de carreira municipal e a mãe Joana Fogueteira, a responsável pelo imenso estoque de fogos de artifícios que explodiam na cidade. Gente importante! Sem a assinatura de Preguiça ninguém conseguia uma cesta básica e sem a autorização da Fogueteira, nada de rojões grátis.
Francine e Tayanna eram rivais desde o prézinho… Nunca combinavam em nada, se uma usava roupa vermelha, a outra usava branco. Eram assim tipo Cocho e Berne, sempre brigando pelas sobras do banquete, mas sempre se entendendo no escurinho da senzala. Ambas resolveram disputar o posto de destaque na gloriosa “Escola de Samba Sereia do Mar Pequeno”
Adrielle e Crislaine foram exemplares em seus esforços… Corrida matinal na Orla Repaginada do Valo, subida sem parada na escadaria do Cristo, caiaque entre o matagal do lagamar… Malhação, dieta e natação diária… No final a diretoria da Escola de Samba foi justa e criou dois destaques para conter e mostrar ao público o ego e outras coisinhas das duas garotas… Quem não gostou foi Maria Marlene!
Maria Marlene já nasceu com nariz empinado e cara de dona do pedaço. Achava-se a “última Manjuba do Ribeira”, no dizer popular “uma coco cheirosa”… O mundo fora criado apenas para ela e para ninguém mais… Graças ao dindim de papai e a dondoquice de mamãe se considerava a mais bela flor da sociedade em flor… Uma Medusa! Seu intento? Destruir as belas e gostosas Francine e Tayanna. Odiava profundamente as garotas, como gostaria de se chamar Brenda Priscila e não Maria Marlene, nome de pobre.
Maria Marlene esperou pacientemente a chegada do carnaval. Comprou um tubo de spray e substituiu o liquido por um produto altamente inflamável… Adorou e copiou a fantasia de uma amiga tão bacana quanto ela. Uma vasta cabeleira negra com uma rosa vermelha e um longo vestido dourado que rodopiava sem maldade no bloco “Meu Tijolinho a Vista” e o povão delirando e perguntando; – “O travéco é daqui?”.
Na apresentação da Escola, Maria Marlene com sua fantasia de Pomba-gira caiçara lançou o produto inflamável no carro alegórico onde sambavam Adrielle e Crislaine… Um fumante que passava afirmou que viu apenas um clarão antes da explosão que transformou a exótica Pomba-gira numa tocha e que a moça tinha olhos vermelhos iguais aos da Medusa.
Não falei que a Medusa está entre nós! Ao falar com estranhos olhe sempre nos olhos… Caso não o transformar em pedra instantaneamente, a pessoa não é uma Medusa! No escuro das danceterias, nas apresentações noturnas, nos grandes festivais, fique esperto! Olho no olho.

Gastão Ferreira/2013

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