UM DIA DEPOIS DO FIM…

            Aquela cidade, tão perto do mar, estava
vivendo dias conturbados. Seus habitantes não sabiam mais a quem recorrer.
Calçadas entulhadas de lixo, impostos atrasados em execução judicial, falta de
emprego, saúde em descrédito, falta de segurança e alguns espertos
aproveitando-se da situação caótica tinham a cara de pau de viajar em jatinhos
fretados para turistar de graça, participar de festas, festinhas e festão em locais
inusitados sem dar a mínima para a opinião pública. A única coisa boa nisso
tudo era que ao se descobrir uma nova farra, sempre através da imprensa, alguém
era defenestrado. Não era despedido por ter participado da maracutaia, mas sim
pelo descuido de falar ou fotografar a gastança secreta.
         O
tsunami foi anunciado com vinte e quatro horas de antecedência por uma agencia norte
americana. Ninguém sabia inglês e quando descobriram o que era o tal tsunami
faltavam exatas cinco horas para a consumação da tragédia. Haviam confundido o recado,
“Tsunami chegará dentro de 24 horas”. Julgaram ser o nome de um japonês que
enriquecera como dekasaki e estavam preparando as boas vindas e estocando
foguetes para a calorosa recepção ao filho amado que daria uma reforçada ao
caixa dois da tribo, quando descobriram o engano.
         Ao
saberem que o tsunami era uma onda gigantesca que varreria para sempre a
progressiva cidade do mapa cultural do mundo, os donos da cidade reuniram-se em
articulações, primeiros os meus e depois os teus…  Cofres foram esvaziados, obras de arte
afanadas, familiares reunidos e carros postos a serviço do pequeno bando se
deslocaram atulhados de bens materiais para locais mais elevados e fora do
município. Todo esse esquema e sua realização consumiram quatro horas. Faltava
apenas uma hora para a tragédia quando o último e honrado cidadão do grupo dos
que sabiam do alerta estrangeiro se apossou da imagem milagrosa do Orago local
e sem olhar para trás abandonou a cidade a sua sina.
         O
povo estranhou a movimentação, mas já estava acostumado com as idas e vinda e
pensou ser mais uma festinha secreta da qual tomaria parte a elite local. A
única coisa que chamou a atenção foi levarem o Santo para participarem do
evento, afinal o São da Ilha era o protetor e jamais poderia participar de
negociatas e atos ilícitos, boa coisa não deve ser! Diziam.
         A
onda gigante chegou, fez seu trabalho matando a totalidade dos habitantes. Todo
o litoral foi atingido e milhares de pessoas desapareceram para sempre. A
pátria chorava a perda de seus filhos, o mundo voltou os olhos para aquela
região pobre e abandonada, ninguém sobreviveu para contar a história…
Ninguém?
         Os
repórteres televisivos descobriram o comboio e a noticia ganhou manchetes na
mídia:- Um grupo de sobreviventes salva um Santo milagroso da destruição.
Apesar de a religião estar em plena decadência, da falta de Fé e de Amor ao
próximo o São da Ilha fez milagre protegendo seus fiéis da morte certa e
preservou para beneficio da nação essas admiráveis figuras que por amor ao
sagrado abandonaram seus lares. Que sejam aplaudidos como exemplo de honra,
coragem e humildade. Um imenso santuário em homenagem aquele que ficará para a
posteridade conhecido como o defensor perpétuo da virtude e do civismo será
erigido, sua contribuição para a obra grandiosa pode ser encaminhada ao
seguinte banco…
Gastão Ferreira
Obs. – Esse texto é ficção… Em nenhuma
cidade que se preze poderiam ocorrer tais fatos. Por favor! Sem carapuças.

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