No Costão da Barra

 

         No
final daquele ano, no último dia de aula Dona Miryam a professorinha rural,
reuniu seus alunos para uma foto; todos juntos e misturados como deve ser em
uma humilde escolinha a beira-mar no Costão da Barra do Ribeira em Iguape no final
dos anos sessenta.

 

         Escola
simples, de madeira e chão batido, erguida em mutirão entre pés de pitangas,
araçás, goiabeiras; os poucos estudantes eram filhos de pescadores, de
mateiros, meeiros da zona rural… Quinze alunos entre sete e doze anos.

 

         Quinze
alunos, e a professora após mandar revelar as fotografias notou que apareciam
dezesseis crianças nos retratos. Impossível! Conhecia um por um os seus alunos,
eram oito guris e sete garotinhas, e na foto havia nove meninos; que coisa
estranha, tinha a certeza que nunca vira, e nem notara aquela sorridente
criança na sala de aula; quem seria?

 

         Na
festinha de confraternização estavam presentes os pais, os tios, os irmãos e
parentes dos alunos; peixes fritos, aipim, tainha recheada na folha de bananeira,
camarão, batata-doce assada, farofa de marisco, maionese e muito suco de frutas
da região.

 

         Depois
da premiação, das muitas palmas, dos elogios, dos conselhos da mestra, a
professorinha mimoseou a turma de formandos com as fotografias; naquele tempo as
fotos eram uma raridade, e um senhor presente.

 

         Felizes
a molecada mostrava aos pais suas caras e bocas nos retratos, e em meio à
alegria geral um grito; – “Juca!”, e Dona Maria Manjuba desmaiou. Corre-corre,
abanador, água com açúcar; quem era Juca? Por que do grito lancinante? Seu
Agenor Baiacu, sogro de Maria Manjuba explicou;

 

        
Juca era o meu netinho, seu maior desejo era aprender a ler, queria ser doutor;
um menino sonhador, inteligente, a alegria de nossa tapera… Gostava de
brincar com seus barquinhos de corticeira no córrego ao lado de casa… Foi
picado por uma cobra jaracuçu e morreu… Morreu na véspera de seu primeiro dia
de aula, e era nessa escola que aprenderia a ler… O menino da foto é o meu
neto!

 

         Silêncio
total, apenas o lamento de uma mãe inconsolável cortava o ar. A brisa que
soprava do mar trazia o cheiro da maresia, a lembrança de dias felizes, dos
risos, das canções; o vento tinha o gosto da saudade, e da porta da escola se
avistava as brancas areias da Juréia. O mar parecia soluçar, e emocionada a professorinha
Miryam chorou.

 

 

Gastão Ferreira/2021

 

 

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