O filho do lobisomem

 

         Dom
Pedro I, antes de deixar o país rumo a Portugal, no ano de 1827 criou o cargo
de Juiz de Paz; a consequência da criação desse cargo foi à ampliação do poder
local dos grandes proprietários de terras, o que também significou a retirada
da justiça da esfera pública, a qual passou a ser responsabilidade dos
latifundiários.

 

         Durante
o Período Regencial (1831-1840) era comum o abuso dos juízes de paz; estes
juízes, juntos com os regentes criaram a Guarda Nacional, e a participação na
Guarda era estipulada pela renda do individuo; os títulos de tenente, capitão,
major, tenente-coronel, e coronel eram vendidos pelo Governo Imperial, e dessa
maneira os grandes proprietários de terras de diferentes regiões brasileiras
passaram a ter autoridade militar.

 

         Durante
a Primeira República (1889-1930) o coronelismo acentuou-se como poder local, e
passou a exercer o chamado mandonismo político; com o decorrer do tempo, os
coronéis da Guarda Nacional passaram a ter o poder de vida e morte sobre as
pessoas que viviam próximas a eles.

 

         Nas
vilas e freguesia do século XIX a autoridade máxima era o Coronel, ele
disputava o mando com o senhor vigário, os dois deitavam e rolavam na vidinha
dos sem eiras e beiras. Quis os funestos fados que por essa época um jovem
sacerdote fosse nomeado como vigário auxiliar numa pequena cidade a beira mar.

 

         Padre
Rodrigo e Coronel Antenor da Matta se detestaram, o padre só não foi morto pelo
coronel porque matar padre era uma passagem certa para o inferno… A causa da
desavença tinha nome e sobrenome; Maria Rita.

 

         Maria
Rita das Dores, ex-escrava, doceira de mão cheia, a rapariga mais linda do
lugarejo; tida e mantida pelo Coronel Antenor… Maria Rita das Dores que se
apaixonou ao primeiro olhar pelo esbelto padre Rodrigo. Maria Rita a mãe de
Adonias, o menino que todos diziam ser filho do Coronel Antenor, mas que era a
cara cuspida e escarrada do padre Rodrigo.

 

         Coronel
Antenor mandava e desmandava, simplesmente retirou o adolescente Adonias da
mãe; o menino-homem foi levado para um dos sítios do Coronel, Maria Rita
confessou ao senhor Bispo que o pai de seu filho era padre Rodrigo… O santo
bispo não queria encrenca com o poderoso político, e designou padre Rodrigo como
capelão de uma vila nos confins da mata…

 

         A
vila para onde o padre fora exilado era famosa por seus lobisomens, e não
demorou muitas luas para padre Rodrigo ser mordido por uma besta-fera…
Provavelmente ele foi o primeiro sacerdote que virou lobisomem.

 

         Maria
Rita confessou ao filho o verdadeiro nome de seu pai; o rapaz foi até o sítio
onde padre Rodrigo era o vigário… O Coronel juntou seus capangas e aprisionou
o jovem fujão, a captura ficou para a história, naquela noite sete lobisomens
foram decapitados, entre eles padre Rodrigo, e na hora de sua morte Maria Rita
se transformou numa mula sem cabeça, prova concreta de que fora amante do padre…

 

         O
jovem Adonias ficou acamado por algum tempo, na refrega foi machucado, ele
jamais contou ao Coronel, a quem chama de pai que padre Rodrigo, o seu
verdadeiro pai era um lobisomem, e que ao ser ferido na escaramuça o mordeu, e
lhe avisou que na próxima lua cheia um novo e valente lobisomem aparecerá…

 

         Adonias
herdou todos os bens e o título militar do Coronel Antenor; casou com Ana
Amélia Marcondes Veiga, mãe dos seus sete filhos homens, sendo que Astério
Veiga da Matta seu sétimo menino já nasceu fadado a ser o próximo lobisomem da
família.

 

         Astério
marcará sua passagem pela história da cidade; violeiro, cantador, seresteiro e
pescador; um poeta de alma gentil, um escritor, um amante de todas as luas
cheias, um lobo…

 

 

Gastão Ferreira/2021

        

        

          

Deixe um comentario

Livro em Destaque

Categorias de Livros

Newsletter

Certifique-se de não perder nada!