Um lobisomem no Icapara

Martha Eugênia de Alencar provou do pão que o diabo amassou, quem na vila já se esqueceu da tardinha em que a donzela dançou com o demônio? Ninguém esqueceu, e digo mais, foi devido ao fato do “Coisa Ruim” tira-la para dançar que a menina moça passou a ser hostilizada pelas outras donzelas com chistes nada amigáveis; marmita do capeta, queridinha de satanás, e por aí vai…

Martha era uma garota normal, meio bobinha, uma menina caiçara criada na beira do mangue como tantas outras icaparanas, o que a diferenciava das demais donzelas era a sua contagiante alegria, sua vontade de viver, seu lindo sorriso e sua humildade no trato com os mais velhos…

Na vila, devido a sua constante brejeirice era chamada de Marthinha Serelepe, mas isso foi antes da famosa dança com o diabo… O estranho é que ninguém se tocou de que a guria não teve a mínima culpa no enrosco, estava no lugar certo, mas na hora errada, só isso…

Poderia ter sido Betinha Francesa, Orlandina Negrão, ou Thayana Guaiamu, talvez Priscila Nunes, ou qualquer outra garota de sua idade, mas o diabo cismou foi com ela, e assim a donzela ficou marcada perante a sociedade… A doce Marthinha Serelepe apagou o facho e passou a ser Marthinha, a triste…

Martha estava se preparando para desaparecer do bairro de Icapara, pensava em embarcar num dos muitos navios que ancoravam no porto de Iguape, e seguir viagem para um lugar distante e desconhecido, talvez Cananéia, ou Paranaguá…

Nesse meio tempo entre o guardar dinheiro para a passagem e a escolha do roteiro para a longa viagem, ela conheceu Ditinho Mamangava, um dos muitos marinheiros que perambulavam pelas ruas de Iguape, e algo muito interessante aconteceu, amor a primeira vista…

Ditinho se mudou de mala e cuia para o Icapara, montou uma peixaria, e foi o primeiro pescador a salgar um peixinho bem comum na região, um peixe de nome Manjuba… Foi o maior sucesso, todos os cozinheiros dos navios queriam ter em sua despensa Manjuba salgada, um produto que não se deteriorava, era durável e gostoso…

Após as núpcias Ditinho Mamangava revelou à Marthinha Serelepe a sua sina; ele era um lobisomem, um ser que devia manter em segredo seu negro fado… Martha Eugênia de Alencar contou ao amado o quanto sofrera por ter dançado com o diabo, e a marca com que a sociedade a presenteou, e que se não fosse por ele, Benedito Euclides do Prado, conhecido como Ditinho Mamangava, ela já estaria para lá de Cananéia… Nunca ninguém desconfiou, mas Ditinho Mamangava foi um dos primeiros lobisomens do Icapara.

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